«Rui Manuel Monteiro Lopes Ramos nasceu em 1962, em Torres
Vedras. É licenciado em História pela Universidade Nova de Lisboa (1985) e
doutorado em Ciência Política pela Universidade de Oxford (1997)», colho na
Internet. Com um currículo de muito interesse de realizações e recompensas que
o ilustram. De facto, gosto dos seus textos, que leio no OBSERVADOR, pautados
pelo equilíbrio e o bom senso, que nem sempre serão bem acolhidos pelos que se
pautam por outras dinâmicas de intelectualidade, quando não de puro psitacismo
reprodutor de chavões de esquerda, ou mesmo apenas de seguidismo malandro, como
meio aprazível de destilar insultos nos seus comentários escritos, contra quem
não alinhe nos chavões da moda.
No texto que segue, sobre o
efeito da imigração numa Europa que se pretendeu democraticamente unida e
filantropa, num mundo hoje a desfazer-se em violência e catástrofe, Rui Ramos
analisa com clareza e bons exemplos o fenómeno dos populismos que brotaram em
vários países como reacção contra as migrações desestabilizadoras que, ao invés
do que se pretendia, em vez de vivificarem as sociedades europeias envelhecidas,
são geralmente causa de acções desordeiras de teor terrorista e ingrato,
provocadoras, naturalmente, de ódio e oposição. Daí a reviravolta nos processos
eleitoralistas, como se tem visto e Rui Ramos esclarece, mas onde nem
europeístas nem populistas conhecem a solução para o problema, no caos criado.
Já não chega chamarem-lhes fascistas
OBSERVADOR, 6/3/2018,
O eleitorado do “populismo” não é a medida de
um anseio de marchar com camisas negras. É o sinal do fracasso dos regimes
europeístas, não apenas em resolver os problemas, mas até em falar deles.
Antigamente, sempre que o “sistema” na Europa era desafiado, bastava
mencionar “fascismo”, para os eleitorados isolarem os intrusos. Foi assim em
França, em 2002, contra Jean-Marie Le Pen. Desta vez, em Itália, o perigo era o
Movimento 5 Estrelas e a Liga (antiga Liga Norte). Sim, são fãs de Putin, são
proteccionistas, e abusam do contraste mitológico entre um povo inocente e uma
oligarquia corrupta. Mas quando o regime tirou da gaveta as acusações do
costume, o eleitorado não respondeu ao assobio do “fascismo”. Muitos
abstiveram-se, mas muitos mais aproveitaram o segredo das cabines de voto para
escolher os candidatos proscritos pelos bem pensantes.
O eleitorado do “populismo” não é a medida de um qualquer anseio de
marchar com camisas negras. É, acima de tudo, o sinal de um fracasso: o dos regimes europeístas, não
apenas em resolver os problemas, mas até em falar deles. A Itália é, com
Portugal, uma das economias que menos bem se adaptou à chamada “globalização”. Há duas décadas que diverge do resto da
Europa. Mas o problema não é só o desemprego. É uma oligarquia que insiste em
introduzir, como fez em 2015, centenas de milhares de imigrantes em sociedades
envelhecidas, economicamente estagnadas e culturalmente confusas. A combinação
entre baixas expectativas sócio-económicas e imigração é a chave do “populismo”
anti-europeísta.
Uma sociedade jovem, dinâmica e com valores claros poderia talvez dar
oportunidades aos recém-chegados e começar a integrá-los. Foi o que aconteceu
nos anos 60 e 70, embora os Estados, nessa época, não proporcionassem aos
migrantes a assistência de hoje. Mas as sociedades europeias actuais já não são assim. O resultado é que as populações imigrantes
não estão a integrar-se, mas a tornar-se o veículo para a projecção na Europa
dos preconceitos e conflitos das sociedades de origem. Durante anos, as elites da UE usaram os apodos
de “fascista” ou de “racista” para calar dúvidas e censurar constatações. Mas
quando até as mais antigas referências da correção política no Ocidente, como
o New York Times ou o Nouvel Observateur, descobrem a
violência dos gangs de imigrantes armados de AK-47 nas cidades suecas, ou a nova
perseguição contra os judeus patrocinada pelo fundamentalismo islâmico na
Alemanha e na França, que dizer? Que o New York Times e o Nouvel
Observateur também são “racistas”? Que é melhor estarmos todos calados,
deixando os receios e os ressentimentos crescerem e alimentarem eleitoralmente
as Frentes Nacionais e as Ligas?
Os populistas não são solução. Frequentemente, como agora na Itália, nem
sequer é claro que sejam verdadeiras alternativas de governo. Falta-lhes os meios para mudar sociedades que,
embora zangadas e aproveitando as eleições para votar neles, não desejam romper
com a vida que a integração europeia lhes garante: por isso, na Grécia, o
Syriza acabou como simples executante das políticas de Bruxelas, e na Itália, o
5 Estrelas e a Liga já se calaram sobre o euro. Talvez isso baste para
sossegar alguns auto-proclamados europeístas nos seus sofás dourados. Mas com
ou sem “populismo”, devia-nos preocupar a contradição de uma elite que por um
lado quer uma Europa democrática, solidária e tolerante, e por outro lado vai
sujeitando o continente a uma dinâmica que acabará por comprometer tudo isso.
Que se pode fazer para escapar, a prazo, à pulverização das sociedades
europeias em comunidades segregadas e hostis, inviabilizando democracias e
Estados sociais? Os populistas, com a sua agitação apocalíptica, não
sabem; mas muitos europeístas, com a sua complacência burocrática, também não.
Nenhum comentário:
Postar um comentário