sábado, 9 de dezembro de 2017

Gritante, mas sem remédio


Mas a insistência de António Costa na “competividade” e nos “Acórdos”, imune a correcções, demonstra à saciedade que ele faz parte da “bênção” de que, segundo Alberto Gonçalves, o país enferma, e por isso aqui vamos nós “cantando e rindo”. Como sempre fomos. Abençoados.

A ignorância é uma bênção
OBSERVADOR, 9/12/2017
Todos sabemos que o sistema que o dr. Costa representa prospera unicamente sobre a apatia alheia, e que, apesar dos foguetes e da propaganda, isto acabará mal. Sabemos, ou deveríamos saber.
Afinal, para que serve o presidente do tal Eurogrupo? Deixemos o próprio dr. Centeno explicar: para “(…) conduzir a discussão para alcançar o consenso necessário à construção de uma UEM com um quadro institucional mais resiliente, promovendo a convergência económica e indo ao encontro das expectativas dos cidadãos”. Serve, portanto, para se aliviar de pateguices semi-analfabetas.
A espectacular irrelevância do cargo e, sobretudo, do seu fresquíssimo ocupante foi devidamente tida em conta pelos “media” lá de fora, que dedicaram ao assunto a atenção que um Maserati dedica ao Museu dos Coches. Já os “media” cá de dentro, ou a parte expectável deles, entraram em previsível êxtase. Não era para menos. Num único “acontecimento” (liberdade poética), juntava-se tudo o que os move: o imaginário brio nacionalista; um lugar de imaginário prestígio internacional; a imaginária consagração das políticas socialistas; a oportunidade de, mediante vénia ou cócoras, voltarem a exaltar os imaginários méritos do dr. Costa. Num desses jornais que vendem 3000 exemplares e cada exemplar inclui 4000 louvores dos poderes vigentes, uma vetusta personalidade do jornalismo caseiro resumiu o tom geral: dado ser óbvio que o dr. Centeno é uma luz resplandecente, todos os que não se curvam ante tamanho brilho são rematados idiotas. Com ligeiras variações de presunção, o tipo de presunção que quem manda despeja em quem obedece, a maioria das opiniões publicadas não se afastou excessivamente da referida em matéria de profundidade e pertinência.
Resta um pormenor. Esta profundidade, esta pertinência e esta presunção não são exactamente novas. Ouvimo-las, das mesmas incansáveis alminhas, no tempo e a propósito do “eng.” Sócrates. Andava o bom homem a esfarrapar o país de alto a baixo, na economia, na liberdade e na decência, e os bajuladores da oligarquia prestavam-se a um papel igualzinho ao que se prestam agora. De facto, não prestam para mais. Ontem como hoje, o comentariado indígena defendia as virtudes dos donos contra os “neoliberais” que duvidavam das ditas. E ai do “neoliberal” que ousasse continuar a duvidar – no mínimo, levava um enxovalho; no máximo terminava no olho da rua. Ontem como hoje.
Após um interregno de quatro anos para verter ódio em cima de Pedro Passos Coelho, vulgo o Usurpador, o comentariado regressou à veneração dos bandos que põem e dispõem disto, actualmente enriquecidos pela aliança jovial com quadrilhas totalitárias. E fê-lo sem arrependimento, pingo de vergonha ou sequer um pífio pedido de desculpas. Essa gente limitou-se a trocar de santinho e, a pretexto do dr. Centeno ou do pechisbeque que calhar, a repetir as lisonjas de sempre. E a aplicar o desprezo de sempre aos que sentem, inclusive na pele, os efeitos do repulsivo estado das coisas.
A propósito de coisas, uma é certa: quando emite as opiniões que os donos lhe ditam, o comentariado não fala no vazio. Por incrível que pareça, existe, fora dos interesses, dos compadrios e das avenças, um público que genuinamente engole os elogios ao dr. Costa com a credulidade, e a abertura digestiva, com que engolia as tentativas de beatificação do “eng.” Sócrates. Porquê? Curiosamente, é o próprio dr. Costa a fornecer uma possível resposta.
Há dias, o primeiro-ministro lembrou: “O maior défice que temos não é o défice das finanças, é o que acumulamos de ignorância, de desconhecimento, de ausência de educação, de ausência de preparação”. Tipicamente, e decerto a título exemplificativo, o homem tropeçou nos conceitos e a frase não faz sentido nenhum (um défice de desconhecimento é mau?). Ainda assim, percebeu-se a ideia, que além de um impiedoso retrato dos senhores que governam, é igualmente um retrato fiel de boa parte dos governados. Não é fácil cometer um erro, insistir em errar e não aprender um bocadinho no processo. Sofrer a hecatombe socialista, pagar pelas respectivas consequências e voltar a abraçar as causas do desastre com a inocência e a esperança iniciais não está ao alcance de qualquer sociedade. Talvez seja necessária uma extraordinária abundância de primitivismo, ou infantilidade, ou estupidez, se preferirem a ofensa.
E há pior. Num país não propenso a confundir-se com um jardim-escola, a reacção natural dos eleitores ao colapso engendrado pelo PS seria escorraçar a seita em definitivo, simbólica ou literalmente. Aqui, pelo contrário, o PS floresce nas sondagens, o CDS é liderado por uma aprendiza do marxismo e o PSD “reforma-se” com entulho de modo a competir em votos com a toleima em curso. Por pudor, não menciono o quinto da população que orgulhosamente escolhe os herdeiros de Lenine e sonha com a felicidade venezuelana. De um lado, há milhões de cidadãos encantados com o saque dos seus impostos para alimentar a pândega (eles chamam-lhe “consciência social”). Do outro, um deserto povoado por meia dúzia de excêntricos. O povo – equívoca palavra – não só tolera a desgraça: exige-a.
O dr. Costa tem razão ao notar a ignorância que por aí vai. E mente ao prometer combatê-la, não por não ser sua obrigação ou por ser um burgesso, mas por não lhe dar jeito. Todos sabemos que o sistema que o dr. Costa representa prospera unicamente sobre a apatia alheia, e que, apesar dos foguetes e da propaganda, isto acabará mal. Sabemos, ou deveríamos saber. Porém, o dr. Costa é o primeiro a admitir, com falsa consternação, que ninguém sabe nada.

Alguns comentários
Paulo Carnaxide
Costuma-se dizer, e bem, que nas sociedades democráticas o comunismo sobe paralelamente à pobreza. Não sei bem qual delas é a causa e qual delas o efeito. O que sei é que há uma relação. No caso português, há também uma relação propaganda-subida nas sondagens do socialismo esbanjador que teve efeito no caso Sócrates e agora no caso Costa. Vejo com agrado a ida do Mr. Bean para presidente do eurogrupo, pois é garantia do fim do devaneio socialista. A desilusão da extrema esquerda é precisamente a percepção disso. A partir de agora, Jerónimo e Catarina vão acusar o PS de subserviência ao grande capital, aliás o BE já disse isso na cara do Costa na assembleia da república, a propósito do recuo do PS no caso das rendas das eólicas. É uma nova fase da vida política nacional. Vai ser engraçado.
fernando simoes
Este artigo está excepcional. De facto a ignorância é fundamental aos governos, sobretudo ao de Costa. Se a maralha inculta e bruta (alimentada pela oligarquia a futebol, a Black Fridays e a viagens baratas) um dia perceber o que é pagar mais de 9 mil milhões em juros e o que isso faz ao país, havia uma revolução a sério! A oligarquia entretém a populaça com as chamadas causas fraturantes (casamento sodomita, aborto, etc...) e assim vai tornando o país escravo, ao mesmo tempo que o destrói moralmente.
Lucília Domingues
Limpinho, limpinho. A verdade pura e dura. Entre a cegueira e ignorância do povo e a subserviência da comunicação social ao poder socialista, temos um país agonizante que só consegue exportar os seus cérebros e os seus jovens por falta de futuro e oportunidades.
Carlos Quartel
Não há mal em repeti-lo, mas há que dizer que o mesmo andamos por aqui alguns, há vários anos, a pregar aos peixes.
Não só a ignorância, como uma grave perda de princípios e uma grande tolerância à  pouca vergonha. A aceitação da geringonça é um sintoma de que o oportunismo, o engano, o abuso do voto, são considerados normais por uma massa acéfala, mais interessada nos calos do Ronaldo, do que na eficácia do SNS ou do aproveitamento dos alunos das escolas desta país.
Quanto ao aproveitamento do episódio Centeno, tudo se passou e está a passar como previsto. É o maior, é um génio, é uma honra para Portugal e para Costa, que o descobriu.
A questão da qualidade do eleitor é um dos grandes problemas da democracia, que não pode deixar de defender o voto universal, sabendo que grande parte das pessoas são ignorantes, facilmente manipuladas e dirigidas. 
Invente-se um inimigo e aí teremos milhões de feras. Hitler com os judeus ou Puigdemond com os espanhóis, há que abatê-los, destruí-los, exterminá-los .......
Miguel Sanches
Sem rodeios, clarinho como água.
Este cenário - o da ignorância - confirma os meus receios de há muito: então é neste ambiente (o da IGNORÂNCIA) que se vai às urnas escolher os melhores de nós para o governo de todos nós? 
Não saio da minha: o voto, assim, é uma armadilha.
Bravo Alberto Gonçalves, mais uma vez!
Manuel Domingues
Umas das melhores crónicas de sempre de AG. (…)



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