sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Dois textos encantatórios


Um, de Maria João Avillez, que nos seus escritos nos dá sempre lições de beleza, de amor, de sensatez, de opções de vida como gostaríamos que fossem as da maioria de nós. Desta vez, foi sobre “Monumentos Nacionais”, quer referentes a Homens de Ciência Médica apreciados por outros Homens de Ciência - que a maioria das vezes nos passam à margem, preteridos a favor de outros festivais de maior êxito emocional, próprios de um povo ruidosamente emotivo - quer de um Convento de grande dimensão e beleza, mandado construir por um rei Magnânimo, que o dotou de seis órgãos de superior qualidade, proporcionando frequentes audições por um organista – João Vaz - de grande virtuosismo.
Talvez não devesse associar-lhe o texto seguinte, optimista com reticências a respeito da Água, que, afinal, temos que chegue até às chuvas que o inverno deverá trazer, livrando-nos destes histerismos de terror pelo fim. É de um Professor Catedrático - NOVA SBE – NOVA School of Business and Economics, crespo.carvalho@novasbe.pte faz-nos igualmente felizes. Daí o tê-los associado, pelo bom momento que me fizeram viver. E a minha gratidão por tal.
1º Texto:      Monumentos nacionais
Maria João Avillez         OBSERVADOR, 29/11/2017
Foi o reencontrar da simplicidade que costuma definir quem convive naturalmente com o seu próprio saber e faz dele um serviço. Sessão memorável, um Portugal digno de registo.

1. Era um dia banal, uma sessão comum, nada me faria antecipar a sorte de estar ali nem adivinhar a surpresa: que Portugal era aquele de que temos tão pouca notícia?
Habituada como estou ao país ficcional e dependente que nos “servem”, espantei-me. Não devia. Há mais Portugal por detrás de écrans e manchetes e mais oxigénio fora da espuma dos dias e dos seus geralmente desqualificantes episódios. Sentada porém na meia luz silenciosa de uma plateia lisboeta, o olhar e o ouvido fixados no friso de oradores sobre o palco, foi-me porventura mais impressiva aquela descoincidência entre o país “publicado” e a excelência – humana, cientifica,intelectual — que transpirava da sala.
2. Tratava-se de um livro. Aberto e lido, “Médicos e Sociedade– Para uma história da Medicina em Portugal no Século XX (By the Book) é, página a página, uma obra substancial e inovadora. Interessará a leigos como eu, será matéria de estudo e consulta, guia de aprendizagem, registo de sabedorias passadas, constará como referência. O tema nada ou quase nada me dizia, a sessão ter-me ia provavelmente passado despercebida não fora o terem tocado audivelmente os “tan-tans” da selva na família: um dos capítulos é exclusivamente dedicado ao meu bisavô Thomaz Mello Breyner, grande estudioso, clínico inovador no tratamento da Sífilis, professor, médico da corte, cidadão de estirpe moral e cultural que nos deixou muito interessantes “Memórias” (e não menos aliciantes “Diários”). Em boa hora fui ao encontro daqueles sábios – os “contados” no livro e os seus “contadores” — agradecendo intimamente ao bisavô que, estou certa, seguiu de algum canto do céu e com deleite igual ao meu esta tarde singular.
3. Tratava-se de um livro mas não foi só isso. Foi o brilho das apresentações escutadas, a qualidade cientifica e cultural dos oradores — António Barros Veloso, Henrique Leitão, Luís Damas Mora, António Rendas (e Salvador de Mello, que tornou possível a obra mercê do patrocínio da José de Mello Saúde); foi o reencontrar essa espantosa simplicidade que costuma definir quem convive naturalmente com o seu próprio saber e faz dele um serviço. Foi enfim o silêncio da plateia perante a palavra do palco. Sessão memorável, um Portugal digno de registo.
4. Um livro é sempre um bom princípio, mas este trazia atrelado uma longa e boa história. Praticante do “a César o que é de César”, vamos ao nosso César. Chama-se António José de Barros Veloso e é um monumento nacional. Pelo que sabe, pelo que fez pela sua vocação clínica, pelo modo como a exerceu, pelo seu entendimento do que é e para que serve a cultura. Pelo que fez com a vida. (Substituiria com vantagem – uma vez que fosse… — qualquer um dos 22 jogadores que todos os dias, vezes demais, vemos nas televisões a correr atrás da bola, e sabe Deus como gosto de futebol).
Barros Veloso, especialista de medicina interna já reformado, exerceu o seu oficio no Hospital dos Capuchos, onde foi director de serviço. Foi sempre um servidor público, assumiu mil responsabilidades, teve carreira exemplar. Tem o olhar atento, o gesto vivo, o diálogo sedutor e, hoje, os mais enérgicos e viçosos 87 anos de que me lembro. Nas suas outras encarnações — a sua vital curiosidade impedir-lhe-ia apenas uma — escreveu um belíssimo livro sobre o Sanatório do Caramulo, é exímio no piano a tocar jazz, dedicou-se, a meias com a mulher, médica também, ao estudo do azulejo de fachada do século XIX, fez e faz incontáveis conferências, possui obra publicada, prémios, reconhecimento.
Ciente e consciente de que era preciso que se conhecesse melhor a nossa (formidável) história médica e das etapas que foram contributo para a medicina universal, Barros Veloso meteu incansáveis mãos à obra. Uma empreitada. Quase novecentas páginas coordenadas por ele, dezenas de autores (médicos, historiadores, sociólogos, biólogos), cinquenta capítulos quase jubilosos na quantidade de história e informação que nos oferecem.
“Fiz um guião mais ou menos cronológico, escrevi os primeiros capítulos…”
Entre a surpresa e alguma dúvida, desagua-se num orgulho pasmado: como foi possível, Portugal tão pequeno, modesto, longe de quase tudo?
Surpreendem-nos os feitos clínicos, as inovações, investigações, estudos, descobertas, mas também as marcas culturais e civilizacionais deixados quando se constata como este largo friso de portugueses esteve em relevo na sociedade do seu tempo: exercendo, inovando, intervindo, discordando, agindo. Perceberam e usaram o poder que tinham, influenciando e transformando: Ricardo Jorge, Egas Moniz, Pulido Valente, o açoriano Azevedo Neves, Reynaldo dos Santos, Lopo de Carvalho, Bissaya Barreto, Abel Salazar, Miguel Bombarda, Corino de Andrade, Jaime Salazar de Sousa, Thomaz de Mello Breyner e… a Rainha D. Amélia foram, entre outros de igual mérito, parte integrante da própria história do país.
5. António José Barros Veloso lembrou-se do historiador Henrique Leitão: conhecia-o, apreciava-o, “elegeu-o” para esta aventura. Pouco depois juntou-se-lhes Luís Damas Mora.
Não seria, decidiram eles, “uma história da medicina do século XX em Portugal”, mas um contributo “para” ela, “tentando perceber o que se passou”. Era preciso contar, “indo buscar o que eles não escreveram”. Sabiam que a tarefa era ciclópica e o resultado incompleto, mas também sabiam que um dia se contará o resto.
“Este livro é sobretudo uma primeira tentativa de abordar a medicina portuguesa do século XX, num registo que não interesse apenas a clínicos ou historiadores”, explica Henrique Leitão. “Aliás, quando se pensa na importância que os médicos e a medicina sempre tiveram na definição de noções tão importantes como vida, morte, normalidade, saúde, corpo, é surpreendente a pouca atenção que esta história tem merecido nas descrições da vida cultural do nosso país.”
Houve a escolha dos autores, a época da escrita, o tempo das revisões (“cyn foi épico ter de cortar alguns textos e uma ousadia tocar naqueles pergaminhos…”), houve o “notável trabalho gráfico da By the Book”. Foram três anos de sobressalto que o livro venceu.
Como se, contra morosidades e peripécias, se fosse escrevendo a si próprio. Lendo-o uma coisa porém é certa: como ponto de partida deve ser impossível fazer melhor.
6. Pedi para conhecer a alma deste livro, ficara muito curiosa. José António Barros Veloso foi amável, conversámos uma manhã. Tinha vindo a pé, pull-over e camisa sem gravata, estava bem disposto. Falou-me da vida, dos filhos (“foi um deles, o Francisco, quem fez o som da “Peregrinação”, o filme do Botelho, trabalha em cinema), de arte, dos seus outros interesses:
O piano é uma paixão, fiz muita música, tudo de ouvido. Cresci a ouvir a minha mãe tocar Beethoven e Mozart. Este verão toquei no Hot Club com os melhores músicos de jazz da Península Ibérica…Os azulejos? Foi um interesse que nasceu nos anos oitenta. Fotografámos, estudámos, a nossa obra é considerada pioneira…”
Com uma convicção emocionada, recordou João Lobo Antunes: “Ainda fez dois capítulos para este livro . (Pausa triste) Era talvez o único senador português…”
Era, sim.
7. Mafra também é Monumento Nacional.
Voltei uma noite destas para um extraordinário concerto com seis órgãos e três coros que celebravam uma missa de autor anónimo do século XVIII.
Vejo por lá cachos de turistas, tenho pena de não ver mais portugueses nos concertos da Basílica, nos claustros onde cheira a buxo, na monumentalidade daquela pedra de onde se soltam episódios de boa e má fortuna da nossa História.
A travessia do Palácio é uma experiência invulgaríssima, a sua Biblioteca um dos nossos melhores ex-libris. Aprendi recentemente que a Enfermaria – pela forma inovadora como a sua “funcionalidade” foi idealizada e concretizada — continua hoje a ser objecto de alta apreciação, cá dentro e lá fora. Os dois carrilhões e a sua “maquinaria” têm devotos, estudiosos e visitantes vindos de todas as partes, num espanto que desde que a ousadia visionária do Magnânimo D. João V os fez encomendar nunca esmoreceu. Órgãos e carrilhões são citados mundo fora. (E o inexcedível zelo e a sabedoria com que o organeiro Dinarte Machado permanentemente cuida deles é outro caso de reconhecimento internacional).
Mafra não se esquece.
8. Num louvável entendimento de serviço público — a que não pode ser alheia a capacidade de iniciativa de Mário Pereira, director deste Palácio Nacional e a sua “fibra” de zelador pelas jóias do Estado –, os primeiros domingos de cada mês trazem-nos o som dos seis órgãos em concertos organizados por João Vaz. O organista-estrela costuma explicar às plateias da Basílica que a excepcionalidade daqueles momentos musicais não reside apenas no talento dos organistas ou no número dos órgãos, mas sim no facto “único no mundo” (Vaz dixit) de terem sido construídos “para tocar como se fora um só”. João Vaz tem-se aliás “ocupado”, ele próprio, da (inspirada) transcrição para seis órgãos de diversas peças, alargando o leque das escolhas destes (e doutros) concertos, enriquecendo assim o reportório musical à disposição de organistas e músicos. Um quase milagre a preservação de tudo isto. Mas tal como quase sempre acontece com os grandes feitos e ocorreu na história do livro que acima referi, também este milagre tem o nome — e a vontade — de duas, três pessoas, quatro pessoas.
À sua maneira são também elas monumentos nacionais. O que não pode deixar de nos conferir uma espécie de responsabilidade. Imaterial ou humano aquele património é nosso. Aquilo é connosco.
2º TEXTO:  Há água em Portugal
José Crespo de Carvalho                    OBSERVADOR, 1/12/2017
Se consumíssemos menos água seria bom? Sim, seria. Mas se fossemos mais visionários já teríamos feito a ligação de algumas redes a outras no sentido de permitir uma melhor gestão dos recursos hídricos
A barragem do Alqueva, o maior lago artificial da Europa e contra a qual muitos se enfureceram e na altura se manifestaram contra, foi e é uma das mais importantes obras hídricas de sempre, senão a mais importante, em Portugal.
Esta barragem, se bem que com o objetivo primeiro (ou inicial) de permitir regadio no baixo Alentejo, desde sempre fortemente depauperado pela seca, é também um reservatório de água gigantesco a céu aberto. É, claramente, a maior reserva de água do país. São só 1.100 Km de margens e 250 Km2 de albufeira.
Esta mesma albufeira comporta, em termos globais, cerca de 4,15 mil milhões de metros cúbicos de água. Na prática estes valores serão os máximos e não os médios. O nível observado (no Alqueva) em Novembro de 2017 era de 2,9 mil milhões de metros cúbicos (cerca de 70% da sua possibilidade máxima que são os tais 4,15 mil milhões de metros cúbicos de água).
A par com este colosso de água temos ainda, em termos de bacias hidrográficas e sem falar em águas subterrâneas, outras menos expressivas mas, em todo o caso, importantes: bacias do Arade, do Ave, do Cávado e costeiras, do Douro, do Lima, do Mira, do Mondego, das ribeiras do Algarve, das ribeiras do Oeste, do Sado e do Tejo.
Todas as águas superficiais destas bacias somam a bonita quantia de cerca de 11 mil milhões de metros cúbicos comportados (possíveis). Em Novembro de 2017 a quantidade, por baixo, nestas bacias era de cerca de 7 mil milhões de metros cúbicos armazenados. Ou melhor, grosso modo, de cerca de 60% dos recursos possíveis superficiais totais.
Seria um erro considerar que toda esta água seria apenas para consumo humano. Demasiado óbvio. A atividade económica, em particular a agrícola, precisa de boa parte desta água. A geração de energia, embora muita água possa ser recuperada, idem. As indústrias precisam igualmente de muitos dos metros cúbicos de entre estes 7 mil milhões de metros cúbicos atuais.
Ainda assim, façamos umas contas por alto. O consumo humano é de cerca de 220 a 250 litros de água por dia. Em metros cúbicos, e pelo máximo, daria qualquer coisa como 912,5 milhões de metros cúbicos por ano para 10 milhões de habitantes. Ora estes 912,5 são bem inferiores aos atuais 2900 milhões que estão disponíveis no Alqueva e bastante inferiores aos 7000 milhões disponíveis em Novembro em todas as bacias acima contabilizadas. Representam nada mais nada menos que, números redondos, 31% do Alqueva de hoje e 13% dos recursos hídricos totais em Novembro (Portugal Continental).
Em todo o caso e para além destes recursos superficiais ainda existem os recursos hídricos subterrâneos. Uma parte da água de consumo (cerca de 30%) vem de fontes subterrâneas.
Todas estas fontes, repita-se, não serão apenas para consumo humano, bem vistas as coisas. Nem serão os consumos mais importantes pois a economia, do primário ao terciário, consome a maioria da água. Em todo o caso, é bom saber que ainda temos água. Contas feitas por alto e ainda temos…alguma água.
Portanto, ainda que o clima (ou a mudança dele) contribua para nos depauperar, ainda que jogue contra nós, talvez possamos aguentar, sem grandes histerismos desnecessários e campanhas radicalizadas, mais algum tempo até que o inverno possa contribuir para a reposição hídrica necessária: restabelecer níveis de albufeiras, realimentar aquíferos e níveis freáticos nos solos, aumentar humidades e regular ciclos de origens e consumos de água. E começar desde já a trabalhar nas soluções estruturais, evitando pensamento com base nas dores do momento.
Podemos, de facto, estar a mudar de clima e de paradigma quanto à quantidade do recurso água de que dispomos. Se chove cada vez menos e se o clima está alterado ou a alterar-se pode ser que não seja apenas nos cenários macro-económicos que possamos ser considerados África+1 (África mais um). Para trazermos algum realismo a esta frase basta olharmos para o nível da dívida e para mais dois ou três indicadores para percebermos que estamos mais próximos de África (Norte de África) do que do centro da Europa.
Tudo isto e aqui chegados apenas para dizer que o mais incompreensível na história das roturas de águas em certos pontos do país, assistindo-se a operações espetaculares de camiões cisterna e composições de água que rumam a repor os níveis em certas áreas mais depauperadas, nomeadamente através da captação noutros locais, seguida de transporte rodoviário e posterior lançamento superficial (com perdas enormes, diga-se), é um cenário pouco edificante. Talvez necessário face às circunstâncias mas pouco edificante. E muito mais próximo de África do que da Europa a que pertencemos.
E qual é a causa para este sintoma? Tal como no combate aos fogos florestais falta (e faltou) uma cadeia de comando única entre todas as forças e recursos mobilizados (isto sem falar em prevenção), o que implica centralização, na água falta colocar os sistemas e múltiplos sistemas regionais e municipais a comunicar entre si. Descentralizados pecam por apenas abastecer as suas regiões mas não podem, se em presença de água, abastecer regiões próximas ou até mais longínquas depauperadas.
Um especialista no assunto dizia-me que, no caso do Algarve havia 2 sistemas distintos, Barlavento e Sotavento. De um lado origens, do outro maior consumo. A resolução do problema passou por se fundirem os sistemas tendo-se construído uma primeira estação elevatória reversível que permitiu e permite transferir água tratada de um lado para o outro, de acordo com as necessidades. E que mais tarde viria a construir-se uma segunda. Se isto acontece agora “no mesmo sistema” também é possível acontecer entre sistemas isolados que passem a comunicantes. E também é possível que haja puro transporte por pipeline. Dir-se-á que terá que haver investimento. Verdade. Mas o investimento faz parte da equação perante problemas destes. Porque não se fez este investimento no passado? Por exemplo quando, ao fim de 50 anos com um projeto nas mãos, se resolveu finalmente avançar com a barragem do Alqueva?
O que temos, no final do dia, é menos água. Mas água na mesma. Muito embora não distribuída.
Assim, o que nos falta está muito mais do lado da interconexão entre pontos sendo ou devendo ser este um dos caminhos, senão o principal, que deve presidir à gestão dos recursos hídricos. A interconexão dos sistemas o homem pode dominar. A chuva, admitamos que é complexo. O stock de água rompe, então, não por falta de água no sistema total continental mas porque há vários subsistemas descentralizados e o stock descentralizado sofre as penalizações da não comunicação com um “centro” que, neste caso, será uma outra rede com excedentes ou com stock não depauperado. Não rompe só por falta de chuva ou por falta de água. Como se viu, existe água.
Ver as imagens televisivas de camiões cisterna a abastecer zonas de recolha de água superficial é um espetáculo, de facto, pouco dignificante. A pergunta principal, e que ninguém faz não se percebe bem porquê, é porque é que os sistemas, não todos mas alguns, não comunicam?
Porque é que as albufeiras (o Alqueva é apenas um exemplo), que são armazéns de águas superficiais, não comunicam com outros sistemas de águas? Se a gestão das origens é fundamental é não menos importante a gestão das interconexões e dos destinos. Podemos ter armazéns descentralizados mas com isto não resolvemos a falta de água, de stock, em alguns pontos do país.
Não se pede que isto seja feito de modo a criar depósitos centrais e centralização absoluta das redes de água. Mas pede-se que haja backups e comunicação entre as redes que apresentam excedentes e aquelas que usualmente enfrentam roturas mais cedo. É também esta a forma de pensar recursos e sobretudo de racionalizar a água que temos.
Se consumíssemos menos água seria bom? Sim, seria.
Se fôssemos mais racionais na utilização dos recursos seria bom? Sim, seria.
Mas se fôssemos mais visionários já teríamos feito, tal como já fizemos o Alqueva, a ligação de algumas redes a outras no sentido de providenciar backups interessantes a pontos onde haja menos recursos hídricos.
Tudo junto e há em Portugal um problema grave. Primeiro confunde-se a centralização dos sistemas (empresariais, leia-se) com uma espécie de economia centralizada que falhou. Nada tem uma coisa a ver com outra, enfim. Depois, não se percebem as principais oportunidades trazidas pela centralização em algumas áreas da economia e da gestão dos recursos. E isto é uma pena. Estamos a falar de uma matéria da área das operações. A que Peter Drucker apelidou de “The Economy’s Dark Continent”. Simplesmente, para Drucker esta era já uma matéria pungente em 1962. Para Portugal, digo eu, é uma matéria pungente há muitos anos mas apenas se está a ter consciência vagarosa dela (oxalá se tenha!), em termos de águas e de fogos, em 2017, 55 anos depois. Com uma diferença colossal. 55 anos depois e ainda não sabemos o seu significado apesar da dor que lhe está associada.
Portanto, melhor esquecer a ideia de que Portugal não tem água. Melhor começar a pensar que sim, tem alguma água, está é mal distribuída. Existindo pontos que, de facto, não têm água suficiente. Mas que existem soluções para isso. Claro que implicam investimento mas, não menos, visão.


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