“Espectacular”,
este “retrato de corpo inteiro” de Maria João Avillez sobre Pedro Passos Coelho.
Ainda ontem escutei o anterior 1º Ministro, sóbrio, determinado, objectivo,
não dando o braço a torcer, convicto da sua razão e da verdade com que
argumenta, indiferente aos aguilhões ou às múltiplas instâncias de urgência nem
sempre oportunas ou mesmo educadas, dos entrevistadores desatentos às respostas
- em atropelo exibicionista de perguntas - e sabendo pô-los no lugar, seguro de
si, sem temer os ataques da segurança ou da impertinência desses, resolutamente
disposto a seguir em frente, convicto dos ínvios caminhos que o actual governo prossegue,
no badalar frequente dos seus êxitos para convencer com êxito o crédulo povo desde
sempre fiado numa qualquer capa protectora, seja da Virgem, da retalhada de S.
Martinho, anunciadora de Verão, ou mesmo o diáfano da fantasia, com que Eça
revestiu a “nudez forte da verdade” realista, que é o mesmo que dizer, a nudez
de um povo em cata de sopas e descanso, que somos nós, “os da mansarda”,
com que também Álvaro de Campos se define a si próprio, embora em diversa
acepção autodestrutiva.
Por
isso, ao texto magnífico de Maria João Avillez, não posso deixar de acrescentar
conceitos colhidos das respostas de Passos Coelho, na tal entrevista da Sic, por
uma Internet prestável e esclarecedora, os quais vêm em apoio da sua postura
corajosa, de timoneiro guiado pelo exclusivo interesse de levar a sua pátria a
bom porto, como já o fora dantes, quando tão arriscadamente lhe agarrou no
volante.
Alto risco
OBSERVADOR
5/4/2017
Não
é verdade que todos os dias a geringonça rescreve a história da anterior
governação fazendo, com indecência e veneno, uma ficção do que ia sendo uma
tragédia real?
Não
se impacienta, não se inquieta, não se espanta, não se altera. Ignora rumores,
é alheio à intriga, descarta o que dizem dele, bem ou mal, mal ou bem. Parece
nada esperar mas talvez espere tudo. Passos Coelho confunde? Sim, para dizer o
mínimo.
Ou
seja: ei-lo a usar hoje os mesmíssimos instrumentos de navegação que usou na
travessia 2011/2015. Fornecidos quer pela sua própria natureza, quer pela
crueza das circunstâncias da viagem, os instrumentos revelaram-se, sabemo-lo
bem, indispensáveis ao mau tempo de então. E a avaliar pelos votos e resultados
obtidos, a liderança sem estados de alma e os instrumentos provaram acerto:
quatro anos depois Passos Coelho voltou a ser o primeiro.
Não
me interessa, neste momento, saber se uns já esqueceram a dureza e crueza da
viagem, se outros ainda acham que a rota deveria ter sido “diferente” ou se
outros ainda exultam com selfies e “ronaldices”, achando hoje a vida mais bela
que ontem.
O
que me interessa agora – quando a travessia já não é a mesma, nem os mares
iguais – é abordar o (arriscado) critério oposicionista de Passos Coelho.
Uma escolha que produz legitimas dúvidas e consente demasiadas perplexidades ao
persistir o líder do PSD no uso dos mesmos instrumentos de navegação e
acreditando até na sua bondade. Acreditando contra ventos e marés (dos
quais não toma nota); contra aquilo que se acha a lógica das coisas (mas ele
não acha); contra o que recomendaria o menu do bom opositor (mas ele não o lê).
Contestação
interna? Tardias soluções autárquicas? Falta de resposta? Falta de discurso?
Falta de escolhas? Não. Primeiro, a liderança tem o seu ritmo: esperar com
infinita paciência que o mundo comungue do seu desagrado e dê razão às suas
críticas. Sem estados de alma uma vez mais, tal a certeza que esse dia chegará
e seja quem for que lá esteja sentado na chefia das tropas; segundo, também tem
os seus calendários: decide quando quer e não em função da jocosa solicitude da
opinião publicada, supostamente “preocupada” com os “atrasos” do PSD na questão
autárquica. Só quando se tornou evidente que a concelhia de Lisboa não
resolvia o problema da capital é que a liderança interveio. Não que ela
achasse que teria sido conveniente mais pressa na escolha e divulgação de
candidatos. Pelo contrário: “não achava de todo” (Passos Coelho dixit),
por não encontrar sombra de “utilidade” nessa reclamada antecedência. Por
outras palavras: entregar, escolhas e escolhidos, às vozes do mundo e deixá-los
meses a fio ao lume da crítica, da enviesada exposição mediática e da intriga…
para quê?
E
finalmente o PSD, sim, tem um discurso que usa, aplica e pratica. É que ao
contrário do que diz o poder e os seus companheiros da esquerda radical, as
intervenções de Pedro Passos Coelho não visam estragar a festa da geringonça
mas demonstrar que é a festa que está estragada de origem. Veio com defeito de
fabrico. O defeito – e o fabrico – dispensam o PSD de mudar a lógica, a linha e
o fundamento do seu discurso e porventura ainda mais, de procurar outro.
E
quanto à falta – gritante, a meu ver – da outra metade do discurso, isto é, de
futuro ou de algo de parecido com “o que ele faria no futuro se”, Passos
Coelho cuida e zela pela herança que deixou, que é outro modo de falar do
futuro: não é verdade que todos os dias a geringonça rescreve a história
da anterior governação fazendo, com indecência e veneno, uma ficção do que ia
sendo uma tragédia real? Que adultera, manipula e falseia dados, números,
factos, informação, de modo a não deixar pedra sobre pedra da história e da
herança da coligação?
Assim
sendo, ocupa-se ele dessa história. E sem nunca abrir mão, nem baixar a guarda,
ressuscita a herança. E se é a “isso” que o governo, o poder, a
esquerda e os mal pensantes chamam “falar sempre do passado”, sim, o
líder do PSD conta-nos como ele foi e não como dizem “falsamente” que ele foi.
Quem porém não estiver distraído (ou obcecado com a duração da sua liderança
que atrasa o ansioso desejo de um bloco central) notará que ele igualmente
fala, claro está, do presente . Do presente da geringonça. Das suas manhas e
artifícios, da sua agenda para o país, dos seu ilusórios feitos. Do permanente
“fingimento” que tudo está bem, a andar bem, na “melhor direcção”.
Por
tudo isto, Passos nem se acha – e ainda menos se olha – como estando acrisolado
num casulo. Vai a meio da viagem. Quem o achar “isto” ou “aquilo”, que o
combata no PSD e lhe ganhe. Sub-entendido: e que vença depois as eleições.
Imperturbável,
fleumático, solitário, com alguma cansada ironia, resiliente e resistente (não
é a mesma coisa) está bem armado para a vida, comporte ela vitórias ou
derrotas. Já provou as duas. É o suficiente? Já o foi, talvez volte (ou não volte?)
a sê-lo, a política não se compadece com certezas antecipadas.
Em
resumo: uma agenda oposicionista de altíssimo risco, um caminho armadilhado
pelo próprio Passos Coelho, olhados ambos, – agenda e caminho – com pasmo. Até
no ressentimento ou no desprezo altivo com que é interpelado no parlamento se
escondem muitos gramas de pasmo: a escolha da rota confunde companheiros,
adversários, amigos e até inimigos. Um caso que certamente não nos
desinteressará até ao seu desfecho.
Agora
percorre o país (autárquicas oblige), não se sabe se com mais paciência que
gosto, mas isso nunca se saberá, é demasiado reservado para isso e o hábito do
dever pesaria sempre mais que uma súbita preguiça ou um inesperado
entorpecimento.
O
que se sabe é que não mudará. Não lhe dará jeito fazê-lo, valha isso o que
valer na sua vida política e na do PSD. Mas que tudo isto, que é quase um
mistério, encerra um tremendo “enjeu”, é verdade. A menos que a ironia cansada
seja pela primeiríssima vez a exposição de um estado de alma, que não seria
senão um sinal.
E
nesse caso… Nesse caso a história teria de ser contada de outra maneira.
Frases de Passos Coelho na entrevista da Sic, extraídas
da Internet:
4.10.2016
«Passos
Coelho diz que vêm aí aumentos nos impostos porque o Governo não tem
outra alternativa para o país. O líder do PSD criticou a falta de soluções
dos socialistas. Foi no Jornal da Noite da SIC, na primeira entrevista aos
cinco líderes partidários.
O que disse Pedro Passos Coelho:
"Para
mim é muito claro que o tempo que estamos a viver é um tempo que está a ser
desperdiçado".
"As
promessas que foram feitas ao país estão a ser goradas, as dificuldades estão à
vista".
"O
Governo apostou tudo numa altura em que já muitas instituições diziam que
cenário era muito otimista".
"Nunca
tivemos qualquer ajuda do PS para poder atingir as metas que eram importantes
para o país".
"O
país perde competitividade, não atrai investimento externo e não está a crescer
o que devia".
"Só
o facto de um 2º resgate poder ser encarado externamente é um susto".
"Existe
um desvio do lado da receita de quase 1.300 milhões de euros".
"O
Governo está a empurrar com a barriga aquilo que é a atividade normal do
Estado".
"O
Estado pode decidir não gastar mas não pode decidir não gastar em
permanência".
"Não
se pode dizer que esta é uma maneira sustentável de ter um défice orçamental
controlado".
"O
Governo está a suster artificialmente a despesa".
"É
importante que um Governo que tem uma maioria absoluta seja transparente nas
regras do Orçamento".
"O
engenheiro Sócrates e o PS passaram o IVA de 19% para 23%".
"Só
ouço falar de reposições e aumentos, dá a impressão de que nos saiu o
totoloto".
"O
PS é que disse que tinha uma solução mágica, por isso é que nos deitou
abaixo".
"Quando
discutimos hipóteses orçamentais há na mesa aumentos de impostos, onde está a
solução milagrosa?".
"Perdemos
vários postos nos rankings de competitividade de um ano para o outro".
"Antes
das eleições há sempre uma expectativa, um levantar de pé por parte dos
investidores".
"Estamos
a cumprir os prazos que estabelecemos para o processo autárquico".
"É
conhecido que dentro do PSD exerci sempre o meu cargo de liderança de uma forma
muito inclusiva".
"Enquanto
estive no Governo tive todo o apoio do PSD e na oposição tenho todo o apoio do
PSD".
"Tenho
moralmente a obrigação de representar todos aqueles que votaram em mim".
"Dentro
do PSD as questões sobre a liderança e a estratégia são discutidas sem
problemas".
"Julgo
que é necessário para o país ter uma alternativa, deste Governo não se vai
esperar qualquer reforma".
"Não
governei a olhar para as sondagens e não estou na oposição a olhar para as
sondagens".
"Se eu seguisse as sondagens, nem as eleições de 2015 tinha ganho".
"Se eu seguisse as sondagens, nem as eleições de 2015 tinha ganho".
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