segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

A ópera continua e os fantasmas somos todos



Julgo que tem razão, Vasco Pulido Valente, e tanta razão tem, que não há muito para dizer, tão decantados são os argumentos já. Por isso ele escreve pouco. O papel dele é o de escrever, não o de apoiar, de se aproximar das pessoas. Sabe que Pedro Passos Coelho, tirado que lhe foi o tapete de debaixo dos pés, pouco mais pode fazer do que aquilo que faz, que é o de mandar as suas bocas, já que lhe falta um batalhão para atacar o adversário, pese embora a ineficácia actual dos batalhões, que nem para limpar as matas servem, como treino físico, para prevenir o alastrar dos fogos ateados pelos fantasmas da nossa ópera quotidiana. Pulido Valente, podia estender-lhe, não o tapete, é claro, mas a mão ou o capote, como fez o S. Martinho ao mendigo. Mas nem VPV é santo nem PPC é nenhum mendigo. Os votos, tê-los-á este quando lhe chegar a vez, embora poucos, talvez, porque António Costa consegue ir atamancando o problema e adiando a solução nesta nossa ópera de muitos trinados, a que assistimos pipilando e estendendo os biquinhos para a minhoca da nossa fome. Há sempre gente leal capaz de reconhecer e apoiar o discurso  honrado de Passos. Não é esse o papel do historiador, apoiar, reconhecendo as contingências, e é pena. E no entanto, julgo que Jaime Nogueira Pinto o apoiaria, sendo igualmente historiador. Uma questão de valores. Ou de consciência. Paulo Portas esgueirou-se pela porta dos fundos, deixou Passos sozinho em palco. A sua sucessora, aos comandos,  luta pela sua vidinha, desligada da noção de pátria, como fez  o antecessor, talvez ressabiado com as prepotências do primeiro ministro de então. Eu julgo que P. Coelho em novo governo, tentaria erguer o país, manobrando com menos dureza que anteriormente, e com crescente eficácia. Mas os seus críticos - e os sindicatos - estes os grandes tresponsáveis da desordem, manipulados pelas mesmas esquerdas, agora mansos por conveniência própria, não do país, mau grado o carpir do muito treino -  dificilmente o deixarão erguer-se ou impor qualquer projecto credível. Resvalemos, pois, fantasmas que somos todos, no nosso deslizar embrutecido e interesseiro, pipilando, de biquinho bem aberto ao cibo.

Direita
OBSERVADOR, 4/2/2017
"… hopes expire of a low dishonest decade…" (W. H. Auden)
Em 2015, quando António Costa fabricou o seu extraordinário governo, Paulo Portas percebeu perfeitamente o que esperava a Direita: a Direita só voltaria ao poder unida e com a maioria absoluta que tinha perdido. Seria razoável que o CDS e o PSD dali em diante fizessem todo o esforço para encontrar uma doutrina comum (mesmo se temporária), um programa comum e uma estratégia comum.
Fizeram precisamente o contrário. Hoje não há Direita. Assunção Cristas de quando em quando lá se vai aliviando de umas sentenças, que não valem nada por si ou em conjunto. Fora algumas piedades sem sentido, ninguém sabe o que ela quer, excepto que gostava de ser presidente da Câmara para seu gozo e humilhação de Passos.
Em pouco mais de um ano também essa veneranda figura não abriu a boca que não fosse para lamentar a existência de Costa, um sentimento compreensível mas pouco útil. Deixado a boiar entre viagens pela província e pequenas querelas de economistas, por que raros militantes se interessam e nenhum percebe, o PSD recaiu na desordem que lhe é habitual na oposição. Recomeçaram as guerras de pessoas, principalmente nas Câmaras, e as guerras de princípio (como a desaustinada guerra da TSU). De política não se fala, para não perturbar o sossego dos caciques.
Passos Coelho passeia por aí com o ar de fantasma de uma ópera que já acabou. E a generalidade dos portugueses, se não gosta do PC, do BE ou de Costa, está perdida e desanimada, sem saber que contas deitar à vida.

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