sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

É apenas uma guerra diplomática



O artigo de Clara Barata fez-me lembrar um livro de que muito gostei - Cisnes Selvagens - de Jung Chang, não por similitude de espaços, mas mais por similitude de tragédias que se processaram no Oriente, no campo feminino, embora o livro atravesse três gerações de mulheres, figuras de grande intensidade e delicadeza, em ambientes e costumes de história vária, que as políticas finais de Mao fizeram arrepiar de horror, na inversão arrasadora das indignas manipulações humanas. Já conhecera os livros de Venceslau de Morais e os seus amores japoneses, que o meu pai guardava na sua estante, e na adolescência, livros da Pearl Buck, a Madame Chrysanthème do Pierre de Loti, inspiradora de ópera, a que se juntariam a magia bem posterior de filmes como “O Império do Sol” de Spielberg, aliando o arrepiante da monstruosidade ou do sofrimento adulto à extraordinária beleza da inocência desprotegida do mundo infantil.
Mas o artigo de Clara Barata não pretende suavizar imagens de horror das tragédias que se passaram lá no oriente asiático que o ocidente talvez ignorasse ou fingisse ignorar no politicamente correcto das relações entre os povos, não interventivas a não ser quando interesses próprios há a defender.
Mulheres de conforto”, mais uma vez o domínio masculino na condução do seu mundo de defesa dos direitos ao seu próprio bem-estar, guerreando em comodidade com a presença feminina necessária a uma masculinidade eficiente em campo de batalha. Os japoneses conheciam a Ilíada, sabiam quanto a disputa de Aquiles e Agamémnon, que roubara Briseide àquele, retardara a guerra de Tróia, por amuo ciumento de Aquiles, e nos novos tempos, de mais despacho, não há esses luxos de espera. Foram milhares as escravas sexuais coreanas  para as tropas japonesas durante a II Guerra.
As mulheres vingam-se com estátuas alusivas, agora que sabem da sua paridade de direitos.


Tóquio e Seul reabrem guerra diplomática por causa de escravas sexuais da II Guerra
Foi erguida uma nova estátua frente a um consulado nipónico, o que o Japão diz violar "o espírito do acordo" de 2015 que deu 7,5 milhões de euros para cuidar das "mulheres de conforto".
A estátua representa as vítimas da escravatura sexual de milhares de coreanas imposta pela ocupação japonesa Yeo Joo-yeon/Reuters


Escravas sexuais: nova guerra diplomática entre Seul e Tóquio
Público, 7 de Janeiro de 2017
O embaixador japonês na Coreia do Sul foi mandado regressar a Tóquio, em protesto contra a instalação de uma estátua frente ao seu consulado na cidade portuária de Busan que recorda as "mulheres de conforto", as milhares de coreanas forçadas à escravatura sexual em bordéis para os militares nipónicos durante a II Guerra Mundial. O assunto motivou um acordo histórico entre dois países no final de 2015, mas os azedumes não cessaram — e a agitação política causada pelo processo de destituição da Presidente Park Geun-hye pode aprofundá-lo ainda mais.
O Japão diz que esta estátua viola o espírito do acordo, no qual o Japão, como antiga potência colonial (a Coreia foi um protectorado nipónico até ser anexada em 1910 e assim permaneceu até 1945), pediu desculpa e comprometeu-se a criar uma fundação, dotada com mil milhões de ienes (cerca de 7,5 milhões de euros) para cuidar das mulheres coreanas que foram escravas sexuais e que ainda estão vivas
Este acordo não foi bem recebido na Coreia do Sul — na verdade, foi um dos pontos mais polémicos do mandato da Presidente Park Geun-hye. O problema é que não contemplou a exigência das sobreviventes, que exigem que Tóquio pague indemnizações formais e aceite a responsabilidade legal pelo que lhes aconteceu.
Agora que Park está a ser destituída da presidência, o próprio acordo pode estar em perigo, disse à Reuters Jeff Kingston, director de Estudos Asiáticos no campus do Japão da Universidade Temple. "Park já é passado na política sul-coreana, por isso acordos feitos com ela não valem nem o papel em que foram impressos", afirmou. "Quando há um vazio de liderança, o Japão reage de forma abrupta e na Coreia do Sul, isto vai ser lido como ‘Tóquio está a aproveitar-se de nós outra vez quando estamos em baixo’", explicou o Kingston.
Tóquio pôs também em prática algumas medidas de retaliação — como a suspensão de negociações para um acordo de apoio à moeda sul-coreana. Seul considerou "lamentável" a posição japonesa.
Esta estátua, paga por uma organização não-governamental, é a segunda a ser erguida junto a uma representação diplomática japonesa. A primeira, que representava uma rapariga de pés nus, de cerca de 1,5 metros, em bronze e traje tradicional, sentada numa cadeira (como a de Busan), foi colocada em 2011 frente à embaixada de Tóquio em Seul. O objectivo era que os diplomatas japoneses fossem obrigados a confrontar-se com aquela figura sempre que entrassem e saíssem da embaixada — para pensarem nas 200 mil mulheres forçadas a prostituírem-se durante a ocupação japonesa.
Os números são incertos — 200 mil é normalmente o número máximo avançado para as coreanas que foram forçadas a esta forma de escravidão. Mas outras mulheres de países asiáticos que foram ocupadas pelo exército nipónico — como a China, as Filipinas ou a Indonésia — sofreram o mesmo destino.
Inicialmente, as autoridades locais removeram a estátua de Busan, colocada a 28 de Dezembro, dia do aniversário do acordo entre o Japão e a Coreia do Sul sobre as "mulheres de conforto". Mas acabaram por repô-la, devido a uma forte reacção popular. A presidente da câmara foi acusada de ser "uma colaboradora pró-japonesa" — um insulto grave, dado o contexto histórico, relata o New York Times.
O embaixador japonês deve regressar a Seul na semana que vem, diz o jornal Korea Herald. E o ministro porta-voz do Governo nipónico, Yoshihide Suga, disse que a estátua de Busan vai ter um impacte negativo nas relações entre os dois países.

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