quinta-feira, 31 de março de 2016

Leandro, Rei da Helíria



É de Alice Vieira este Texto Dramático de leitura obrigatória no 7º ano.

É constituído por 9 Personagens principaisRei Leandro; as três filhas – Amarílis, primogénita, Hortênsia, a segunda, Violeta, a mais nova (benjamim); os três futuros genros – Felizardo, Simplício e Reginaldo;  o Bobo; o Pastor. As Personagens secundárias são o Conselheiro, o Escrivão e os Criados e Criadas, que intervêm nos Coros.

Estrutura externa da peça: É constituída por 2 Actos, com 11 Cenas o I Acto e 11 Cenas o II - o que traduz equilíbrio - e um final em verso.
Estrutura interna da peça:
Acção (Síntese do Conflito): O Rei Leandro conta ao Bobo um sonho estranho premonitório sobre a perda do seu Reino. O facto concretiza-se com a divisão do Reino e partilha pelas filhas mais velhas e a entrega da mão destas a dois Príncipes, e com a expulsão da filha mais nova, que usou uma comparação pouco elegante – o sal da comida - para exprimir o seu amor pelo pai. Esta casará com outro Príncipe. Ao fim de algum tempo, o Rei é expulso pelas filhas mais velhas, será reduzido à miséria, mas acabará por ser reencontrado pela filha mais nova, num epílogo feliz de reconciliação, depois de ter compreendido o alcance da imagem do sal.

Espaço:  O I Acto , decorre  no espaço do Palácio do Rei . O II Acto decorre em espaços alternadosEstrada (Cena I), Gruta do Pastor (Cena II), Palácio de Amarílis e Simplício (Cena III, flash-back sobre tempo anterior - analepse), Gruta (Cena IV)  Palácio de Violeta e Reginaldo (Cena V, tempo posterior - prolepse), Gruta (VI) Palácio de Violeta e Reginaldo (VII), Portas do Reino (Cenas VIII, IX e X), Palácio de Violeta e Reginaldo (XI e XII).

Tempo: Não existe unidade de tempo, o II Acto decorrendo anos depois do I, com recuos e avanços, segundo os espaços (Ver em Espaço).

Caracterização das Personagens:

Rei: Homem prepotente, rei absoluto, irritadiço, preocupado, amante das filhas, ingénuo, pois não sabe distinguir o verdadeiro do falso, simplório, permitindo as familiaridades do Bobo, e não  percebendo a grosseria, indelicadeza e interesse dos pretendentes das filhas mais velhas.
Bobo:  Personagem de farsa para divertir o Rei, dizendo verdades e fazendo momices, mas esperto, prudente, conhecedor da vida e revoltado, embora sentindo pelo Rei verdadeiro carinho.
As filhas do Rei, com o nome simbólico de flores, correspondendo ao carácter de cada uma (Descodificação: I Acto, final da Cena III):
Violeta: simples, carinhosa, virtuosa, sedutora, como a flor - roxa, humilde (planta rasteira), modesta, perfumada.
Hortênsia: flor vistosa, de porte elevado, correspondente à Mulher altiva, caprichosa, inconstante.
Amarílis: Flor de “rara beleza, corresponde a uma mulher bela, artificiosa, enganadora, sofisticada, falsa, trocista.
 Genros: Têm igualmente nomes simbólicos das suas personalidades – ridícula a de Felizardo (o par de Amarílis), caricata a de Simplício (o par de Hortênsia), verdadeiro Senhor (rei) Reginaldo, o par de Violeta:
Felizardo (< feliz): vaidoso, tosco, arrogante, interesseiro, grosseiro de modos, de sentimentos e de linguagem pouco educada, julgando-se importante, falando alto …
Simplício (< simples): simplório, limitado, reduzido o seu discurso a um estribilho: “Tiraste-me as palavras da boca” com que pretende traduzir que o seu pensamento é em tudo semelhante ao de Felizardo, mas incapaz de o exprimir, muito parvo.
Reginaldo: (< regis = rei) afável, responsável, amante, positivo, não dando importância aos sonhos mas compreensivo e atento, apaixonado pela mulher, respeitador do sogro.
Pastor: adjuvante, bondoso, prestável, alegre, amigo e admirador da sua mulher (Briolanja), chamando-se ele Godofredo Segismundo, nomes pomposos medievais (cómico de contraste entre a condição social e os nomes pretensiosos).

Sequência das cenas do conflito:

I ACTO: . A Queda do Rei.
Cena I: O Sonho (premonitório) do Rei
Cena II: A bulha entre as irmãs mais velhas
Cena III: O significado das flores.
Cena IV: Combinação dos casamentos.
Cena V: O sonho (premonitório) de Violeta.
Cena VI: Os criados cantam (as suas funções; a sua revolta contra a sua condição social).
Cena VII: Os três pretendentes (oposição entre o sentimento e a razão, o amor e a matéria).
Cena VIII: O acordo das mais velhas com as teorias materialistas dos seus pretendentes.
Cena IX: As irmãs mais velhas – cínicas e interesseiras.
Cena X: O amor das três filhas manifesto em frases: a falsidade do discurso hiperbólico contra a sinceridade do discurso simples.
Cena XI: As decisões do Rei relativamente à distribuição da herança do seu reino: o Norte agrícola para Amarílis, o Sul mineiro para Hortênsia. Violeta expulsa, por conta do sal.

II ACTO: A Retoma da Felicidade
Cena I- O passado majestoso, o presente de miséria nas falas do Rei e do Bobo.
Cena II- O Pastor dá guarida e ouve a história contada pelo Bobo.
Cena III- Luz para flash-back sobre o passado: a expulsão do Rei pelas filhas mais velhas.
Cena IV- O conselho do Pastor ao Bobo: procurar Violeta e contar-lhe a história.
Cena V – A denúncia do Pastor a Violeta sobre o paradeiro do Rei.
Cena VI- O Reino a que pertence o Pastor (Reino de Reginaldo e Violeta): de felicidade, democracia,  de não violência.
Cena VII-  Regresso ao presente: preparativos para receber o Pai.
Cena VIII- Perto da felicidade.
Cena IX- Um rei gradualmente feliz.
Cena X- A história contada por Reginaldo.
Cena XI- O desenlace: um rei feliz.

Final: Quadro-Síntese da história, cantada pelas personagens principais, sobre os respectivos papéis na peça, com a moralidade – referida pelo par Violeta-Reginaldo e pelo Rei, finalmente desperto, sobre o significado do verdadeiro amor, e concluindo com a frase-estribilho de Simplício: ”Tiraram-me as palavras da boca”, de efeito cómico.



Nota:  A peça é inspirada numa tragédia de Shakespeare (o maior dramaturgo inglês) (séc. XVII): «O Rei Lear»
 

quarta-feira, 30 de março de 2016

Um texto apresentado como de Mia Couto e afinal de Ruth Manus, leio na Internet




Enviou-mo João Sena por email, talvez enganado como eu.  
O Bruno fez hoje catorze anos tímidos, que julgo não chegarão  - talvez infelizmente – ao quadro apresentado por Mia Couto / Ruth Manus, de uma geração que contesta o passado oprimido dos pais e dos avós, gerações antigas, soterradas em compromissos, em trabalho externo, mas seguindo adequadamente as obrigações próprias dos seus ajustamentos com a vida  - do emprego, do lar, da família, das diversões q.b..
Segundo Mia Couto / Ruth Manus, uma geração moderna cavalgou numa lógica de prioridades – prioridade do estudo, do curso superior, do emprego que pontua o mérito, do mérito que premeia o homem, com lautas espórtulas em função de um progredir para o qual é chamado favorecendo a empresa. E viajando. A prioridade das viagens, na ânsia de abarcar a aldeia global em que se tornou o mundo, tornando cada vez mais real a frase latina do «a nada do que é humano sou alheio» - «Homo sum, humani nihil a me alienum puto».
Uma geração que virou, pois, escrava do conceito da liberdade opcional, e quando despertou, sentiu que, afinal, talvez o viver mais moderado, das justas ambições de uma vida familiar e simultaneamente de trabalho, de ambição tantas vezes abafada no meio termo da modéstia, provavelmente tornasse esse homem antigo mais feliz, e o homem moderno, das prioridades racionais – indiscutivelmente mais egoístas – menos realizado do que os seus antepassados.
Um texto assustador. É certo que, neste país de tantas pessoas que enriquecem indevidamente – não, forçosamente, jovens – os patrões, como em todos os tempos, sugam os empregados, em baixos salários e em excesso de horas de trabalho. E essas gerações ambiciosas e amantes das prioridades não serão assim tantas quantas aponta Mia Couto.
Para o Bruno e os meus outros netos mais novos – a Mafalda, a Beatriz e o Sebastião – só desejo que um dia saibam aliar racionalidade e sentimento, na construção das suas vidas, as minhas netas mais velhas – a Ana e a Catarina – tendo sabido criar as suas próprias opções, com inteligência e coração. Quanto ao Pedrinho, que a Ana nos irá apresentar em Julho, que ele seja semente de uma geração bem diversa “da triste geração que virou escrava”, segundo conceito justamente apreensivo de Mia Couto / Ruth Manus.

«A triste geração que virou escrava»
– Mia Couto? Ruth Manus?
“E a juventude vai escoando entre os dedos”.

Era uma vez uma geração que se achava muito livre.
Tinha pena dos avós, que casaram cedo e nunca viajaram para a Europa.
Tinha pena dos pais, que tiveram que camelar em empreguinhos ingratos e suar muitas camisas para pagar o aluguer, a escola e as viagens em família para pousadas no interior. Tinha pena de todos os que não falavam inglês fluentemente.
Era uma vez uma geração que crescia quase bilíngue. Depois vinham noções de francês, italiano, espanhol, alemão, mandarim. Frequentou as melhores escolas. Entrou nas melhores faculdades. Passou no processo seletivo dos melhores estágios.
Foram efetivados. Ficaram orgulhosos, com razão. E veio pós, especialização, mestrado, MBA. Os diplomas foram subindo pelas paredes.
Era uma vez uma geração que aos 20 ganhava o que não precisava. Aos 25 ganhava o que os pais ganharam aos 45. Aos 30 ganhava o que os pais ganharam na vida toda. Aos 35 ganhava o que os pais nunca sonharam ganhar. Ninguém podia os deter. A experiência crescia diariamente, a carreira era meteórica, a conta bancária estava cada dia mais bonita. O problema era que o auge estava cada vez mais longe. A meta estava cada vez mais distante. Algo como o burro que persegue a cenoura ou o cão que corre atrás do próprio rabo. O problema era uma nebulosa na qual já não se podia distinguir o que era meta, o que era sonho, o que era gana, o que era ambição, o que era ganância, o que necessário e o que era vício.
O dinheiro que estava na conta dava para muitas viagens. Dava para visitar aquele amigo querido que estava em Barcelona. Dava para realizar o sonho de conhecer a Tailândia. Dava para voar bem alto. Mas, sabe como é, né? Prioridades. Acabavam sempre ficando ao invés de sempre ir. Essa geração tentava se convencer de que podia comprar saúde em caixinhas. Chegava a acreditar que uma hora de corrida podia mesmo compensar todo o dano que fazia diariamente ao próprio corpo. Aos 20: ibuprofeno. Aos 25: omeprazol. Aos 30: rivotril. Aos 35: stent. Uma estranha geração que tomava café para ficar acordada e comprimidos para dormir. Oscilavam entre o sim e o não. Você dá conta? Sim. Cumpre o prazo? Sim. Chega mais cedo? Sim. Sai mais tarde? Sim. Quer se destacar na equipe? Sim.

A triste geração que virou escrava da própria carreira
Mas para a vida, costumava ser não: Aos 20 eles não conseguiram estudar para as provas da faculdade porque o estágio demandava muito. Aos 25 eles não foram morar fora porque havia uma perspectiva muito boa de promoção na empresa.
Aos 30 eles não foram no aniversário de um velho amigo porque ficaram até as 2 da manhã no escritório. Aos 35 eles não viram o filho andar pela primeira vez. Quando chegavam, ele já tinha dormido, quando saíam ele não tinha acordado.
Às vezes, choravam no carro e, descuidadamente começavam a se perguntar se a vida dos pais e dos avós tinha sido mesmo tão ruim como parecia. Por um instante, chegavam a pensar que talvez uma casinha pequena, um carro popular dividido entre o casal e férias em um hotel fazenda pudessem fazer algum sentido. Mas não dava mais tempo. Já eram escravos do câmbio automático, do vinho francês, dos resorts, das imagens, das expectativas da empresa, dos olhares curiosos dos “amigos”.
Era uma vez uma geração que se achava muito livre. Afinal tinha conhecimento, tinha poder, tinha os melhores cargos, tinha dinheiro. Só não tinha controle do próprio tempo.
Só não via que os dias estavam passando. Só não percebia que a juventude estava escoando entre os dedos e que os bónus do final do ano não comprariam os anos de volta.”
Texto de Mia Couto? De Ruth Manus?
(Imagens retiradas aleatoriamente da internet.)
Entretanto queria avisar que dentro de poucos publicarei na TRAVESSA um texto sobre uma aventura que vivi na praia de Benaulim.