segunda-feira, 4 de abril de 2016

No café



Já tínhamos falado com indignação sobre as histórias de um país com enorme percentagem de doenças do foro mental, na véspera escutáramos um programa com neurologistas, psicólogos, e doentes dos nervos, vulgo, depressões, e ouvimos histórias desses doentes encerrados na sua tristeza infinita e nos seus medos, nos objectos de que se rodeiam, como companhia da sua solidão, nas crianças que desde cedo são “sedadas” para concentrarem a sua atenção ou para limitarem a sua excitação de meninos desatentos – hiperactivos se lhes chama – a quem hoje, por vezes, se dá irresponsavelmente – eu diria mesmo criminosamente - medicação substituta da educação. Um caso desses nos passa à beira, alguém que não suporta frustrações, e cuja medicação psiquiátrica transformou num zombie – mas apavorado e pedindo socorro – que se mexe devagar e treme com as pernas, graças a uma injecção mensal e outras drogas que diariamente deve ingerir. O programa mereceu a nossa discussão, eu achei que os hospitais psiquiátricos tinham bastante responsabilidade no panorama grave de um país com tantos casos de doenças mentais. Falei por mim, a quem uma pretensa depressão resultante de muita pressão vivida a certa altura me pôs a tremer graças à medicação de efeito antidepressivo. Mas abandonei as drogas, não podia suportar a minha própria imagem de tremuras que me punham num farrapo de tristeza e velhice, quando sentia a cabeça a trabalhar razoavelmente, como sempre fora, apesar das falhas de memória. Larguei as drogas, agora vou envelhecendo normalmente, venci o medo e o cansaço. Mas a nossa amiga, impressionada, como todas nós, com o programa do Canal I da véspera, concluiu que não havia acordo entre psiquiatras e psicólogos e convinha explorarem essa questão. «Não é caso para um estudo sério? » – dizia ela. «Será que nos outros países a carga medicamentosa para o cérebro ou os nervos desarranjados é assim tão explosiva como no nosso país?” interrogo-me eu há muito, desde que me apercebo da realidade que me envolve.
E a propósito do excelente desempenho e da excelente caracterização dos actores do DDT – anteontem com especial relevo para Ana Bola, no papel de Lady Betty, e Joaquim Monchique no de José Castelo Branco, falei da peça “Romeu e Julieta” em termos entusiásticos, que vira no 2º canal, de actores principais jovens e excelentes, especialmente a protagonista de Julieta. De cortar a respiração, também pelo extraordinário do discurso shakespeariano, de imagens e conceitos geniais.
Mas a minha Paula chegou entretanto, alegre e optimista, e pouco depois ouço mais uma explosão da nossa amiga, toda retorcida para a Paula, que generosamente mas com convicção se saíra da seguinte forma - «Vocês não parecem nada ter essa idade». E a nossa amiga retorcida, ainda eu estava a digerir a satisfação da presença da Paula: «- Olha, valeu a pena ela vir, para ouvirmos esta». A minha irmã ria, também feliz,  e contou logo um caso de alguém que lhe disse coisa semelhante comparando-a com outra pessoa mais nova e mais acabada. Eu nada comentei, embora também já tivesse ouvido ditos semelhantes, com que concordo quando me vejo num espelho a certa distância. E ainda por cima vejo mal.

Nenhum comentário: