quarta-feira, 19 de agosto de 2015

O Pingo Doce é mais eficiente…



Uma das questões educativas que a democracia trazida pelo 25 de Abril impôs, para grande estupefacção minha, habituada a respeitar as regras de compartimentação dos diversos Serviços que impediam a interferência alheia no foro de cada um, foi a sucessiva intervenção da família no âmbito escolar, a que não fora habituada. Educada para ensinar as disciplinas da minha preparação técnica, (que a multiplicidade de experiências anuais, com as várias turmas e anos escolares, além de cursos de formação do meu interesse, naturalmente iam fazendo progredir em competência e diversidade, com o auxílio precioso dos manuais escolares apetrechados de orientação específica), parecia-me atrevida interferência no meu trabalho essas reuniões que punham em confronto pessoas a ele alheias, embora, evidentemente, aceitasse a reunião ocasional individual com o encarregado de educação para qualquer problema específico relacionado com o educando.
Mas parece que agora o Ministério da Educação pretende transferir a responsabilidade do ensino para as diversas câmaras municipais de cada área, e aqui vamos nós, de velas enfunadas, navegando e entrechocando, num ensino cada vez menos rigoroso em preceitos unificadores, sujeito ao capricho e à competência nem sempre comprovada, de cada presidente de câmara.
Estamos na época do ruído, da interferência popular, da massificação, das discussões infindáveis em torno dos jogos futebolísticos, do embrutecimento generalizado. Mas parece que os próprios treinadores e seleccionadores dos clubes não admitem assim tanto as interferências alheias no seu trabalho, em que são reis. Podem exprimir-se bem ou mal, com educação ou sem ela, mas as televisões os destacam, elas próprias ajudando ao maralhal da deseducação nacional. São reis no seu trabalho e alguns ganham de forma obscena, a condizer com a sua realeza. Não é o caso dos professores, é facto assente, cada vez menos autónomos, lacaios de mandatários de um ministério de um governo que assim se vai desresponsabilizando das pastas que não dão dinheiro, tal como das postas que, ao que parece, nas suas vendas, ajudam a curar as pústulas trazidas, há muitos anos já, nas pistas do enriquecimento próprio…
E tudo isto a propósito de um artigo que li no Jornal I, de Mário Bacelar Begonha, (12/8/2015), com o qual concordo inteiramente: «Enfim, se por razões economicistas querem entregar a gestão das escolas às câmaras, nós então contrapomos que é mais eficaz entregá-las às “mercearias”, controladas pelo Jerónimo Martins, ou à outra do Continente. É que esses não brincam em serviço e são 100% eficazes.
Se querem brincar, vão para o sítio próprio, mas não provoquem quem sabe do que está a falar e ensinou durante 60 anos! Não brinquem com coisas sérias e tenham juízo. Estudem os problemas e perguntem a quem se preparou a vida inteira para poder responder.»

Qual municipalização das Escolas?! O Continente é que está a dar! O Pingo Doce também:

«Educação nas câmaras municipais»
Por Mário Bacelar Begonha, Sociólogo. Escreve quinzenalmente à quarta-feira 
Jornal I, 12/8/2015
«Não foi por acaso que espíritos cultos e avisados, no passado, denominavam por Ministério da Instrução aquilo que anos mais tarde alguns “optimistas” resolveram chamar da “Educação”, sem cuidarem de saber se a escola é o sítio próprio para receber educação ou instrução! É que a educação implica instrução, mas esta pode existir sem aquela, o que é altamente inconveniente e prejudicial a um país.
Significa isto que a educação deve ter um carácter global, enquanto a instrução abrange apenas um aspecto da educação, sendo, pois, parcial.
A questão “filosófica” que se coloca é saber como será possível educar sem formação adequada e, por outro lado, procurar definir qual o “sítio”, próprio e adequado, para formar quadros para educar, ou será que estamos condenados a ter apenas pessoas que vão tão-só “instruir” outras?
Na faculdade procura-se instrução, conhecimento, saber, mas não educação. Na faculdade procura-se chegar à verdade, mas esta faz parte da educação que deveria conter a instrução, embora seja caricato admitir que esta possa prescindir da verdade.
No entanto, seria desejável que os cursos universitários com a vertente “ramo educacional”, ou seja, destinados ao ensino, tivessem a educação como elemento preponderante do curso, mas afinal estão apenas a falar de pedagogia, o que quer dizer apenas a arte de ensinar, de transmitir conhecimentos.
Ora a verdadeira educação terá de ser ensinada, primeiro, em casa, no seio familiar, na tenra idade (infância), e depois complementada na escola.
Significa isto que é a escola que deve ter um papel importante na educação da juventude, mas por esta (educação) deve entender-se cultura; usos, costumes e tradições.
Será educação uma senhora levantar-se para cumprimentar um homem? Será educação comer a fruta à dentada, como se vê nas cantinas universitárias? Será educação cuspir no chão, na rua, na via pública? Será bem educado ou não todo aquele que se levanta quando toca o hino nacional? Será educação levantar-se para beijar o pai que chega a casa, quando o filho já tem 60 anos? E vice-versa?
São todos estes aspectos que deveriam ser ensinados, transmitidos na escola, na faculdade, mas como será isso possível se lá tal não é ensinado, até porque a maioria dos que ensinam não receberam essa educação?!?
Ora aqui está uma excelente oportunidade para ensinar as pessoas a serem pessoas através da prática do desporto, já que ele tem uma pedagogia própria e exige disciplina e regras que têm de ser observadas, sob pena de se sofrerem danos, alguns irreversíveis.
É evidente que as gerações pós-25 de Abril não sabem quão honroso e educativo era o serviço militar obrigatório que, só por si, educava o povo que por lá passava e substituía, positivamente, a escola quando ela não podia cumprir parte da sua missão, por não ter recursos humanos à altura (da missão).
O que está aqui em causa é a avaliação da possibilidade de a educação passar para as câmaras municipais. Ora não conseguimos entender a falta de sensibilidade de certas pessoas, ou talvez de cultura, para não perceberem o ambiente que se vive numa câmara municipal, que tem mais a ver com a vida empresarial de uma cidade, de negócios, de terrenos, de licenças, de planos directores, etc., etc… e nenhuma vocação ou preparação para questões educativas.
Por outro lado, todo aquele que se preocupa com questões de ensino e de educação, por regra, morre pobre. Já o mesmo não se pode dizer de alguns que vão para as câmaras e que, quando as abandonam, não conseguem justificar o património que possuem! Perguntem ao Paulo Morais, que sabe da poda e é um exemplo de dignidade.
Enfim, se por razões economicistas querem entregar a gestão das escolas às câmaras, nós então contrapomos que é mais eficaz entregá-las às “mercearias”, controladas pelo Jerónimo Martins, ou à outra do Continente. É que esses não brincam em serviço e são 100% eficazes.
Se querem brincar, vão para o sítio próprio, mas não provoquem quem sabe do que está a falar e ensinou durante 60 anos! Não brinquem com coisas sérias e tenham juízo. Estudem os problemas e perguntem a quem se preparou a vida inteira para poder responder.
Só o Ministério da Educação tem vocação, e recursos, para gerir problemas ligados à educação, e portanto é lá que ela deve permanecer. Perguntem também ao Conselho Nacional da Educação, que tem obrigação de se pronunciar.»

Um comentário:

Ricardo disse...

Mais fácil do que entregar às câmaras e juntas de freguesia, em que existe muita falta de instrução, seria entregar o ensino à Vodafone, à NOS (Nus), à MEO (Mel em brasileiro) ou à Fónix… qualquer delas estaria apta a fornecer megafones aos profs para se fazerem ouvir na turma, ou oferecer portáteis para os alunos passarem a ter aulas muito remotamente. Tão remotamente que pudessem tê-las na praia ou no campo...