quarta-feira, 20 de agosto de 2014

“Cântico Negro”



A Igreja e os seus missionários e missionárias foram sempre um bom meio de difusão da cultura e da língua portuguesa, sendo ainda elementos suavizadores da exploração feita pelos colonos. Mas outras “igrejas” havia e missões protestantes, que se iam insinuando e alimentando ódios contra o domínio português, além da catequização maometana e os próprios rituais indígenas  que o governo português sempre admitiu nos seus territórios. Mas o papado, que se “modernizou” em teorias de fraternidade e libertação dos povos, ao assumir a defesa dos “explorados”, mostrou ele próprio o seu pendor não evangélico de difusor do cristianismo, mas de difusor de doutrinação marxista, que era o que “estava a dar” na altura do terrorismo lá pelas Áfricas, além de que tais mostras de bondade visavam redimir todo um seu passado de esplendor, avidez e crueldade inquisitorial, nem que para isso tivesse que espetar a faca num povo ridiculamente apagado, mas que se arrogara do direito de possuir terras onde, apesar de tudo, contribuíra para levar a palavra de Cristo, o que não era importante. “O próprio clero, por intermédio da rádio, faz-se pregão das teorias democráticas contra o “terrorismo branco”, deturpando por completo a intenção nobre dos que assim reagem”, escrevi eu em 1974 Pedras de Sal» - "O belo programa").
Hoje, que a doutrinação islâmica pretende fazer alastrar cada vez mais a sua influência dogmática e fundamentalista causadora de tantos distúrbios, anda o Papa novamente a evangelizar e a apelar à paz, papel que gosta de assumir. Mas  as misérias que vão por África, de fome e torturas, que levam a África a assaltar a Europa em fuga aterrorizada, parece que lhe são indiferentes, mais propenso às deslocações pela Ásia, com outras comodidades e menos riscos …
Foi este comentário que me acudiu, ao ler o artigo de Salles da Fonseca,  «XICUEMBO – XICUEMBO (3)», sem resposta para as questões postas, julgando que o que deixámos de civilização valeu a pena, em termos universais:

XICUEMBO – XICUEMBO (3)
Na sequência do que afirmei no final do texto anterior, dá para perguntar agora: se as velhas misérias missionárias em Moçambique (exploração de «prazos» com base no trabalho escravo) se passaram muito antes de a moderna administração portuguesa ter iniciado a corrida do desenvolvimento no âmbito de um modelo em que multidões de pretos, brancos, pardos, mistos e amarelos eram directa e significativamente beneficiados, como se explica que a Igreja se voltasse então contra Portugal apoiando os movimentos de rebeldia? Só tenho uma resposta: a Igreja quis lavar a sua própria história naquelas paragens. Mais: se o próprio Papa se recusava a admitir que a Deus se pudesse chamar Xicuembo e que as almas dos que já partiram e por quem se reza na Missa pudessem ser invocadas por esse nome de Deus, que tinha aquela Igreja a ver com a cultura dos povos que se propunha defender contra um «usurpador» que, esse sim, beneficiava os «oprimidos»? Só tenho uma resposta: a Igreja continuava a desprezar as culturas desses povos e simultaneamente não queria repetir experiências para si difíceis como a dos ritos na Índia. Mais ainda: a Igreja queria transmitir a ideia de ser muito «boazinha», coisa que naquelas paragens nunca fora. Ou será que a Igreja, habituada a preponderar localmente através da sua rede de Missões, temia a concorrência que a Administração Civil portuguesa lhe fazia com a sua revigorada rede de Postos?
É evidente que não me posso fundamentar em sussurros de confessionário mas toda esta acção adversa da Igreja contra Portugal foi claramente contrária à tradição paulina.
Mas é também claro que esta é argumentação facilmente contestável pela Igreja se afirmar que o segredo do confessionário é inviolável e que a tradição paulina não constitui dogma nem chega sequer a ser imperativa. E tudo continuará sem a explicação lógica que nós, portugueses, lhe poderíamos pedir.
O facto de termos sido nós a dar «boleia» ao cristianismo até às paragens que palmilhámos, isso é «coisa» menor que a Igreja considera por certo como não tendo nós feito mais do que a nossa obrigação como cristãos confessos.
E como teria sido a História se as engrenagens da nossa corrida pelo desenvolvimento não tivessem sido emperradas, nomeadamente pela Igreja?
Como teria sido a História se nós tivéssemos dado a devida importância às culturas genuínas dos povos que governávamos em vez de as vermos apenas como simples folclore?
Como teria sido a História se as nossas Forças Armadas não tivessem sido corroídas pelo Partido Comunista Português como forma de colocar o Império Português nas mãos do Império Soviético?
E as perguntas poderiam continuar, até que alguém nos lembrasse que nunca poderemos conhecer os resultados de experiências não experimentadas.
Valha-vos, moçambicanos, o facto de entretanto o Império Soviético ter implodido.
Valha-vos, moçambicanos, Vocês serem genuinamente civilizados mesmo sem as religiões que os forasteiros vos quiseram impor substituindo Xicuembo pelos nomes de Deus e de Alá.
É que, em Moçambique, o erro de todos os forasteiros, leigos e religiosos, europeus ou outros, foi o de, tomando-vos por atrasados animistas, não reconhecerem a vossa como uma civilização que poderia ter sido aprimorada em vez de combatida.
E agora?
«Agora é tarde e Inês é morta».
Agosto de 2014

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