domingo, 3 de novembro de 2013

A esquizofrenia da megalomania


Da fábula 217 de Esopo, cujo título resume
O assunto da sua história
-“ Os dois cães que rebentam, à força de beber” -
Fez Fedro a fábula XX
Do seu "Fabulário"
- “Os Cães esfomeados” -
Que ao contrário daquela,
Contêm a moralidade
Que lhe dá universalidade
Pela sua aplicação à Humanidade:

“Um projecto insensato
Não só não obtém êxito
Como leva os mortais
A perdas infernais”.

Daqui parte La Fontaine,
Para mais uma
Elegante e sentida
História da vida:

 «Os dois Cães e o Burro Morto»

«As virtudes  deveriam ser irmãs
Tal como são irmãos os vícios:
Mal um destes últimos
Nos nossos corações se instala,
Vêm todos em fila,
Sem faltar nenhum.
Ouço até falar
Daqueles opostos
Que num mesmo tecto
Se vão albergar.
Quanto às virtudes de cada um
Raramente se vêem
Colocadas no ponto mais alto
De cada sujeito,
Pelas mãos agarradas, sem estarem dispersas:
Um é valente, mas exaltado
Outro é prudente mas mal-humorado.
Entre os animais, gaba-se o Cão
De ser competente
E fiel ao seu dono.
Mas é parvo e guloso.
Testemunham-no os dois Mastins
Que viram um Burro
A flutuar sobre as ondas,
Morto,
E com o vento a afastá-lo mais e mais
Dos nossos Cães.
“Amigo, diz um, os teus olhos
São mais eficazes que os meus
Lança um pouco os teus olhares
Sobre a planura das águas.
Julgo ali ver qualquer coisa.
É um Boi, é um Cavalo?
E que importa o animal?
É sempre um naco de carne
O ponto está em obtê-lo.
Porque o trajecto é enorme
Para alcançá-lo,
Além de que, contra o vento
Será preciso nadar
Bebamos antes a água
Que satisfará a mágoa
Da nossa garganta seca.
O corpo em breve ficará
A descoberto e será
Provisão para a semana.
Eis os nossos Cães a beber
E o fôlego a perder,
E a vida seguidamente;
Tanto fizeram que rebentaram
Num instante.

 O Homem é feito assim:
Quando um assunto o inflama
A impossibilidade desaparece
Da sua alma.
Os votos que faz, os passos que perde
Na ânsia em que arde,
A esfalfar-se, a correr,
Para os bens ou a glória obter!
“Se eu amanhã aumentasse os meus Estados!”
“Se eu pudesse encher os meus cofres de ducados!”
“Se eu aprendesse o Hebreu, as Ciências, a História!?”
Tudo isso é o mar que se bebe, tudo é desmesurado.
Mas nada ao Homem é suficiente:
Para favorecer os projectos que formou um único espírito
Quatro corpos seriam precisos;
Mas longe de a isso bastar
A meio caminho iriam ficar:
Enfim,
Para que bem se veja:
Aquilo que um só deseja
Nem quatro Matusaléns
Poderiam levar ao fim.»


 Cá por mim,
Eu nem sei bem se concordo
Com tal teoria.
Se é verdade que há projectos
Que metem água e de que se pode dizer
Que foram pela água abaixo,
Secos,
Outros projectos há
Que resultam eficazes
Sobretudo para os valentes
Que lutam com muito jeito
Pelo próprio proveito.
Independentes!
Mas até com precedentes.

 
E afinal,
Que seria do progresso,
Já o disse Gedeão
 Na “Pedra Filosofal”,
Não fosse ele resultante
Do sonho que é constante
Na vida de toda a gente
- Excepto, naturalmente,
Os “Eles” que o desconhecem
Segundo as mentes
Dos mais inteligentes:

“Que sempre que um homem sonha,
O mundo pula e avança
Como bola colorida
Entre as mãos duma criança”.

 Mas de facto…
Só é preciso cautela,
Não vá ele estilhaçar
Num desacato.

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