segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Uma história de continuidade diluviana



Um passeio sintético e objectivo pelos meandros de uma história de horror que vamos acompanhando, no meio dos nossos próprios fogos, como aqueles, obedecendo a interesses económicos ou de domínio, de retaliações, de forças destruidoras, e por isso apelativas de um “deus ex machina” que solucione os problemas da Síria. Os aviões Canadair, vindos do ar e trazendo água, funcionam no teatro do nosso horror nacional, para solução momentânea, ajudando bombeiros e populações para solução imediata, embora a tragédia a longo prazo, de incúria, crime e impunidade fiquem de fora da sua solução.

Os Estados Unidos poderão obedecer ao apelo dos sírios rebeldes, com o apoio da Turquia e parceiros de segurança, por ora reticentes, para a solução mirabolante imediata do sofrimento desses Sírios rebeldes – sunitas – agora atacados por armas químicas de origem desconhecida. O tal “deus ex machina” de um ocidente favorecendo, ao contrário do que anuncia, uma continuidade de luta religiosa entre sunitas e xiitas, a pretexto de generosa retaliação desse crime do uso de armas químicas sobre civis inocentes, poderá desencadear mais tragédia incontrolável a nível mundial. Não será “deus ex machina”, mas um deus maquinador, que ao defender o seu poderio, contra o poderio russo e congéneres, vitimizará o mundo inteiro em conflito de consequências imprevisíveis. E o mundo inteiro espera, assustado, talvez antes uma intervenção divina que lhe vá atamancando a vida “tant bien que mal”, na sua continuidade precária.

O texto de António da Cunha Duarte Justo «POBRE SÍRIA PARA ONDE VAIS -A guerra muçulmana entre Sunitas e Xiitas ao serviço dos EUA e dos lóbis de armamento internacional»,  postado no blog “A bem da Nação”, é uma explícita página sobre a questão:

«A Síria é o palco da guerra muçulmana entre a confissão dos xiitas e a dos sunitas. A luta de influências entre os dois grupos é bem-vinda aos países da Nato porque lhe oferece a oportunidade de combater a influência russa na região e de fortalecer a Turquia como bastião avançado da NATO numa região que se pode estender pela Ásia Central, Rússia, Cáucaso, China, etc. Com a intervenção militar dos EUA, o Ocidente quer fomentar a soberania do islão sunita (Turquia) sobre o islão xiita (Irão). A Nato com a Turquia e a Arábia Saudita apoiam os rebeldes sunitas e a Rússia com o Irão apoiam o governo sírio e os rebeldes xiitas (xiitas Hezbollah).

Baschar al Assad, presidente da Síria, pertence aos muçulmanos Alevitas (uma comunidades islâmica liberal com raízes no islão xiita mas que não segue os 5 deveres do Islão, nem o seu sistema de direito-sharia, e não frequenta a mesquita, nem interpreta o Corão à letra e reconhece mulheres e homens como iguais – um argueiro no olho islamista). Como se vê a Síria oferece-se como o melhor campo de batalha para as rivalidades entre NATO e Rússia, entre as facções sunita e xiita, entre Irão e Arábia-Saudita, entre Ocidente e Irão, dando oportunidade a todos estes para apoiarem os seus grupos rebeldes e em nome deles transformar um conflito religioso local num conflito político-militar regional. Por isso a imprensa internacional dá tanta importância aos rebeldes que camuflam interesses estratégicos estranhos à Síria e no fim só se aproveitam os extremistas religiosos e o Ocidente na reconstrução. Resumindo: na Síria alinham-se os interesses dos aliados EUA, Turquia, Arábia-Saudita e dos sunitas contra os interesses da Rússia, do Irão e dos xiitas.

O conflito descarregado na Síria é quase uma cópia da “Guerra dos 30 anos” entre a confissão protestante e a confissão católica; por trás do conflito religioso encontrava-se o conflito entre o sacro império germânico e a Áustria (dinastia dos Habsburgo) que envolveram, nessa guerra, a maior parte dos países da Europa. Tal como na guerra dos 30 anos do séc. XVII em que os conflitos religiosos entre católicos e protestantes davam oportunidade aos países e principados europeus para tentarem impor o domínio duns sobre os outros, repete-se hoje um conflito religioso muçulmano não declarado entre as duas confissões na Síria, Paquistão, Afeganistão, Iraque, Egipto, Líbia ao serviço de tendências hegemónicas da NATO, Rússia, Turquia, Arábia-Saudita e Irão.

Os Média ocidentais estão, duma maneira geral, ao serviço duma informação confusa e confundidora, dado estarem também eles ao serviço dos interesses estratégicos e económicos do Ocidente; por isso favorecem uma intervenção do Ocidente contra a Síria. Quem paga a factura é o povo ocidental com impostos e a obrigação de receber os refugiados que o Ocidente produz e o povo muçulmano obrigado a manter-se sob o jugo divino e sob o jugo regimes despóticos. Este conflito, que não deveria ser nosso, só serve a escalação do poder e os interesses das indústrias de guerra e de reconstrução. Uma intervenção militar seria mais um acto da selvajaria que o Ocidente e a Rússia, com gosto, atribuem a outros povos não tão “desenvolvidos”.

António da Cunha Duarte Justo

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