sábado, 10 de agosto de 2013

Pot-pourri


Vasco Pulido Valente é pessoa de grande competência na visão dos problemas da história hodierna, universal e pátria. E de muito humor sarcástico, que a respeito da casta nacional lhe merecem os heróis pátrios, à excepção do Soares da sua predilecção.

Tenho diante de mim três jornais «Público», que mão fraterna me providencia habitualmente. Do primeiro, de 3 de Julho - «O Novo Ciclo» – extraio que, após as suas férias a ler e a dormir – não refere mais nenhum alimento físico ou espiritual – conclui sardonicamente sobre o “quo vadis” nacional, que «no fundo não aconteceu nada. Uma vulgaríssima zaragata no Governo, conversas sem sentido com o Presidente da República, a obrigatória tentativa de conciliação das partes e no fim as mesmas caras a dizer o que sempre disseram e que toda a gente já sabe de cor e um estreante (parece que prometedor)» Em suma, o prolongamento refinado da mesmice queirosiana ao assumir a oratória politiqueira, mas também a constatação de que «a nossa tendência para a asneira não irá miraculosamente desaparecer; e que o povo com certeza que descerá à “rua”, sem saber o que quer nem perceber o que pede. Não importa. O nosso velho conservadorismo, que até persiste em se agarrar a Pedro Passos Coelho, não gosta de excessos. E o que sucede em Portugal, por definição é português.»

Do segundo, de 4 de Agosto, «O chefe da Oposição», extraio a lauda inicial sobre Soares e as suas “declarações proféticas” que desta vez, como são rebatidas, parecem aureoladas de ironia, mas simpática, subentendendo gratidão pelos pretensos benefícios trazidos em tempos por Soares à liberdade e à democracia, mas desprezadora dos malefícios causados a toda uma pátria de gente dispersa e trabalhadora, reduzida a uma pátria palreira e pedinte, descontados os mafiosos da pecúnia de velha estirpe, que se organizam na combinação e no silêncio, ou no silêncio da combinação.

É sobre o “presente envenenado” a Paulo Portas, que posteriormente será passado a Seguro e ao PS, para retornar ao PSD, com ou sem CDS, num rotativismo de reconhecida idoneidade, até à consumação da desgraça pátria. É sobre as “três ilusões” de Soares sobre que assentam as actuais políticas, que Pulido Valente contesta – a da austeridade compatível e favorável ao crescimento, incriminatória de Coelho e de Gaspar e que Soares entende poder desmanchar-se com “uma dúzia de cabeças socialistas, com a sua notória racionalidade e lucidez” para o país começar a “arrebitar”. A segunda ilusão de Soares e acólitos é sobre uma Europa abrindo solidariamente os cordões à bolsa para nos “desenrascar”. Consta a última ilusão, “a mais grave, de Seguro e da esquerda” na crença sobre o ganho a obter, negociando com os credores.

E conclui com a alegoria do “défice como chefe da oposição”: «Um velho ministro da Monarquia escreveu uma vez que não valia a pena discutir ininterruptamente no Parlamento e nos jornais, porque o chefe da oposição era o défice e o défice não se deixava convencer. A azáfama dos partidos por causa de uns votos para as câmaras roça o obsceno. Na penúria e com a perspectiva de mais miséria, o único objectivo sério que lhes sobra é a sua própria sobrevivência. Só que o défice não lhes fará o favor. Nem à direita nem à esquerda.»

Uma página desassombrada que todos reconhecem na clareza de uma verdade sem mácula, fingindo, todavia, ignorá-la, apresentando falsas soluções alternativas ou apenas rosnando e abocanhando, mesmo que seja de lentilhas o prato oferecido no ganho.

E a coroar todas estas análises, embora precedendo o texto anterior, uma página de história que mereceria ser reproduzida na íntegra, mas de que transcreverei apenas os parágrafos finais. É o texto “Estamos sozinhos” de sexta feira, 2 de Agosto:

Inicia-se com a referência à opinião generalizada sobre a obrigação da Europa de nos estender a mão:

«Mas ninguém se pergunta se a Europa pode de facto ser “solidária” (para usar a expressão comum). O que não deixa de ser curioso, porque, entregue a si própria, ela nunca o foi. O famoso século de paz, que precedeu a I Guerra, não se distinguiu pela sua cordura e, no fim, era um impossível novelo de suspeitas, de manobras, de ambição e de conflito, que em 1914 ninguém conseguiu impedir que explodisse. Pior ainda, só a intervenção da América impediu que a matança continuasse indefinidamente ou se resolvesse por exaustão ou simples miséria. Sucede que a América (o Congresso americano) se recusou a tutelar a Europa arrasada e ressentida de 1918 e voltou ao isolacionismo. É sabido o que sucedeu depois: do império hitleriano ao império de Estaline, o horror prevaleceu durante quarenta anos.

No extremo ocidental, a América e a Inglaterra, com exércitos de ocupação, impuseram uma certa ordem e algum crescimento e a Europa até se julgou curada da sua velha história e um cúmulo de virtudes que o mundo devia imitar e venerar. Infelizmente, o colapso da URSS (e do comunismo em geral) desinteressou a América da Europa e esta Europa de hoje recaiu na competição e na mesquinhez do passado, sob a sombra da Alemanha que redescobriu sem vergonha ou remorso as suas pretensões de hegemonia. A moral é clara: sem a influência (e o domínio) de uma potência que a ponha em ordem, a Europa reverte aos seus vícios. A “solidariedade” (linda palavra) não existe e menos para nós que não pesamos nas conversas dos “grandes” com os seus vassalos. Estamos sozinhos e sairemos, ou não sairemos, sem qualquer ajuda.»

Mas as nossas exportações aumentaram e o desemprego baixou, rezam as crónicas hoje. É uma esperança saudável.
 O problema grave é que pretendemos a solidariedade externa mas não utilizamos a interna. Salvo para socorrer os coitadinhos, uma óptima forma de abocanhar mais o governo responsável por todas as mazelas.

Por isso permaneceremos sós e doentes, como o António Nobre, coitado, que morreu tuberculoso. E também como o "Coitado do Álvaro de Campos, tão deprimido nas sensações”.
Definitivamente, “Ai do Lusíada, coitado”!

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