sábado, 8 de junho de 2013

“Não Culpado”


O artigo, saído no blog “A Bem da Nação”, Verdades incómodas», de João César das Neves, é mais um daqueles textos de que se poderá dizer, se não usarmos de sofisma, que é claro como a água dos rios que escorrem das serras, gelada e transparente. Demonstra matematicamente que nunca os reformados descontaram o suficiente para auferirem os vencimentos que a dada altura lhes foram concedidos, demonstra que a reivindicação dos direitos dos trabalhadores é algo igualmente utópico, sobretudo porque muitas vezes tais direitos não tiveram como contrapartida o cumprimento dos deveres de competência e assiduidade que seriam normas exigíveis a verdadeiros profissionais, demonstra que a dívida particular é, no mínimo, tão desequilibrada quanto a estatal, embarcados os cidadãos na mesma onda de empenhamento desregrado que tudo ceifou do país, por largos anos.
Mas só sabemos gritar contra os carrascos que nos impõem o dever de pagar a dívida e nos vão ao bolso injustamente.
O caso é que os nossos pecados foram redimidos por Cristo. Daí a reivindicação usual da nossa inocência em qualquer crise. Cristo é quem tem a culpa:

«VERDADES INCÓMODAS»

«Existem algumas verdades sobre a crise que muitos tentam esconder. Elas perturbam o mito confortável de que as culpas pertencem a um grupo de malfeitores, quase todos políticos. O melhor é deixar as coisas como estão, pois assim todos podemos considerar-nos vítimas, sem arrependimento ou remorso. Recomenda-se então que não leia o resto deste texto, revelador de factos subversivos.

Os reformados estão hoje entre os críticos mais vociferantes. Mas seria bom que notassem que não descontaram o suficiente para as reformas que agora gozam. Basta uma continha simples para perceber que a contribuição de uma pequena parcela do ordenado nunca permitiria vir a receber um montante quase igual a essa remuneração durante um período quase igual ao do desconto. Isto chama-se "crise da segurança social" e é tema de estudos e debates há décadas.

Pode dizer-se que têm direito a receber o que diz a lei, aliás escrita pela geração agora reformada. Mas o que não faz sentido é protestar abespinhado contra o corte como se fosse um roubo dos montantes acumulados. Desde 1974 que o nosso sistema de pensões não é de capitalização, sendo pagas as reformas pelos descontos dos trabalhadores do momento. Quando uma geração concede a si própria benesses superiores ao que pôs de parte, não se deve admirar que mais tarde isso seja cortado, por falta de dinheiro. Se alguém pode dizer-se roubado, não são os actuais pensionistas, mas os nossos filhos e netos, que suportarão as enormes dívidas dos últimos 20 anos, e não apenas na segurança social.
 

Outro mito cómodo é o que diz que os direitos dos trabalhadores e o Estado social estão a ser desmantelados. De facto, os direitos que a lei pretendeu conceder nunca foram dos trabalhadores, mas de alguns trabalhadores. Muitos empregados no privado nunca tiveram aquilo que agora cortam aos funcionários públicos. Além disso, a percentagem média de contratados a prazo é, desde 1983, quase 18%, ultimamente sempre acima dos 20%. Somando isto aos desempregados, inactivos, clandestinos, etc., vemos a larga privação dos supostos direitos. Os exageros das regulamentações neste campo são só benefícios que um grupo atribuiu a si mesmo. Como isso aumenta os custos do trabalho, prejudica fortemente o crescimento e o emprego, agravando as condições dos mais necessitados.

Quanto ao Estado social, ele teve como principais inimigos aqueles que durante décadas acumularam supostos direitos sem nunca se preocuparem com o respectivo financiamento. Aproveitaram os aplausos como defensores do povo, receberam benefícios durante uns tempos e, ao rebentar a conta, zurzem agora aqueles que limpam a sujidade que eles criaram. Em todos os temas políticos, como no campo ambiental, esquecer a sustentabilidade é atentar contra aquilo mesmo que se diz defender.

Finalmente, no que toca à dívida, é importante considerar que a maior parte não é do Estado. As empresas estão descapitalizadas, as famílias endividadas, os bancos desequilibrados. Todos participámos da loucura dos últimos 20 anos; não apenas os políticos. As maiores responsabilidades são dos dirigentes, mas o povo não foi só vítima inocente de uma festa de que gozou durante décadas.

 A culpa até é dos credores, que alimentaram a mesma loucura. Esta é a última verdade incómoda. A nossa dívida, das maiores do mundo, nunca poderá ser paga. Assim, todos os envolvidos terão de suportar algum custo, devendo encontrar-se uma partilha razoável. Mas para isso Portugal não deve fazer de galaró arrogante, repudiando o débito ou exigindo renegociações. Prudente é uma atitude serena e negociada, mostrando que estamos dispostos a assumir culpas e suportar sacrifícios, mas pedindo que se encontre um equilíbrio que, aliviando parte da carga, nos permita limpar o longo disparate e abrir um novo ciclo de progresso e prosperidade que beneficiará tanto credores como devedores.


Estas são algumas verdades do momento. Indiscutíveis, mas incómodas, que muitos preferem ignorar. Por isso foi avisado que não devia ler este texto.» 27 de Maio de 2013

 
 
        E o meu comentário no “A Bem da Nação:
 
«Li, com muito gosto e concordo em absoluto com as verdades nele expostas e que há muito penso, sentindo-me um peso com um vencimento que, embora sinta que mereci, neste momento, como reformada, não tenho direito ao mesmo que os que trabalham, até porque, quando me aumentaram, foi com dinheiro alheio e isso sempre senti que foi uma tremenda fraude contra a nação. Com encargos desses (para além de outros despropósitos), não há nação que resista. »

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