sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Il y en a partout

Tenho andado a ler Du Bellay
E outros poetas franceses do Renascimento,
Relembrando estudos feitos outrora
Que hoje foram varridos da escola
Do nosso país sem alma nem alento
Agora.
Como Du Bellay chorou amargamente,
Exilado em Roma, a sua pátria distante,
A sua “França, mãe das artes, das armas e das leis
Também eu sinto a dor da nossa amorfa escola,
Que tudo mistura, numa confusão,
E abandonou, com ingratidão,
A língua do país das Luzes
A que nós fazemos cruzes,
Renegando a orientação
Que poderíamos colher dos seus maiores,
Autores que o mundo inteiro ilustraram
Com o espírito das obras que escreveram.

Entre tantos dos seus sonetos e outras obras
Fez Du Bellay um, sobre o retrato dos cortesãos,
Que nós não temos por não termos rei nem corte,
Mas que cabe perfeitamente
Em qualquer lugar onde haja um que mande
Com governados a lutar pela sua sorte,
Bajulando, rindo, denunciando,
Com uma lata enorme
Com astúcia grande.

O soneto de Du Bellay foi desmontado
Em prosa por vezes rimada,
Que pretendeu traduzir, naturalmente,
A ideia nele assinalada,
Mais do que o estilo inefável,
Por falta de engenho, claramente,
Para, devidamente, traduzir o intraduzível.

Soneto de Du Bellay
«Os velhos “Macacos de Corte”»,
Transposto, com desgosto,
Para estrofes de vária sorte
E não com as quadras e os tercetos
Que estruturam os sonetos:

«Senhor, eu não poderia com bons olhos olhar
Esses velhos “Macacos de Corte”
Que nada sabem fazer a não ser
O rasto dos Príncipes seguir
De igual sorte,
E pomposamente como eles trajar.

E se o seu Amo troça de alguém
Eles o mesmo farão, porém,
Se ele está a mentir, não serão eles quem
0 vai contrariar.
Muito pelo contrário, vão dizer,
Com euforia,
A fim de o comprazer,
Terem visto, sem constrangimento,
A lua, em pleno dia,
Ou à meia-noite, o Sol bento.

Se alguém, diante deles, do Rei recebe
Um franco olhar,
Logo o vão elogiar,
E mesmo acarinhar,
Mau grado a raiva da sua inveja;
Se o olhar real contra esse for
Duro que nem penedo,
Apontam-no a dedo.

Mas o que mais contra eles me enfastia
É quando, diante do Rei, sem mais nem quê,
Com um rosto de pura hipocrisia
Eles desatam a rir sem saberem porquê.»

A coisa passa-se aqui da mesma forma,
Em qualquer lugar
Em que o patrão é rei e o trabalhador lacaio.
Não é só norma
Em Belém ou no S. Bento do Parlamento.
Insinuar-se, eis o savoir faire indispensável
Para se poder singrar.
E isso implica não só os gestos que Du Bellay focou
No retrato do seu cortesão,
Mas outros muitos, ou mesmo só mais um,
Que a experiência de cada um
Foi aprendendo a reconhecer
Naquele que os aplicou,
Todos eles reduzidos a insegurança,
Mesquinhez e subserviência.
Não há paciência!

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