quinta-feira, 7 de julho de 2011

A pata

Se antes nos sentíramos felizes com um Governo que parecia iniciar uma nova era de actuação, na promessa de um rigor e transparência que faltara antes, e na seriedade e educação de um discurso inteligente, a notícia que ouvíramos ontem sobre a redução a lixo na classificação económica de Portugal pela Moody’s, deixara-nos indignadas, apanhadas na surpresa do que nos parecia um golpe baixo, que não dera a oportunidade de verificação das anunciadas reformas, atribuindo a nota antes das provas prestadas.
É certo que há muito que pairava entre nós, como véu soturno de vergonha e preocupação, esse conceito negativo de sermos lixo, resultante da indignidade com que fôramos convivendo durante décadas da redução da consciência nacional, concomitante com a redução do território nacional, e transformada gradativamente em consciência de classe, pela elevação a novos estatutos sociais dos que se souberam insinuar nas malhas tecidas pelo dinheiro fácil que sobre nós choveu, dos empréstimos não da nossa integração mas da nossa dependência preguiçosa de que grande parte de nós se aproveitou, sofregamente, obscenamente.
Sim, fizeram-se obras, bastantes obras, excessivas e inúteis por vezes, na megalomania de povo que fora sempre mísero e que, no desejo de se equiparar àqueles povos mentalmente e socialmente defendidos, se locupletava no esbanjamento consumista, num fartote materialista sem prevenção, nem receio de consequências, indiferente ao futuro, desprezador do passado.
E os Governos foram-se sucedendo, no deslumbramento do dinheiro fácil que levaria à corrupção, à defesa do interesse próprio, ao descalabro económico pela omissão de obras propícias à criação de riqueza, ao trabalho, ao emprego. Que levaria às discrepâncias sociais cada vez mais gritantes.
Lixo. Foi a classificação da Moody’s.
Mas o meu filho João explicou que, além de uma infâmia, se tratava de uma manobra americana desestabilizadora, para destruir o euro, começando pelos países da periferia… Porque também os Estados Unidos estão grandemente empenhados, embora com recursos para colmatar o défice. Não lhes convém a coesão europeia.
Poderá ser. Eu vejo-a como um acto desprezivelmente traiçoeiro. Porque reduziu antes de analisar, classificou sem ter em conta as promessas de um novo Governo que parece empenhado. E sério, talvez pela primeira vez.
Mas a Moody’s não deve saber desses dados ínfimos de um novo Governo de um país sem préstimo.


Uma agência pondo a pata, indiferente à miséria que cria.
Um dia apoiará canções beneméritas do estilo “We are the world”. Ou apoiará o envio de agasalhos e géneros alimentícios para sobrevivermos.
Porque os Estados Unidos são cimeiros na caridade.

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