sexta-feira, 13 de maio de 2011

Altar do Mundo

- Olha lá, o Santo Padre já tem uma estátua que não é brinquedo. Em Fátima. Já está a tirar protagonismo aos pastorinhos. Vê a quantidade de gente que vai lá!
Não usamos o tuteamento, cerimoniosas que somos no mútuo tratamento, utilizamos a terceira pessoa verbal precedida - ou não – do nome próprio (substituto do você, que não faz parte da nossa gramática – nem a pedante, nem a respeitosa, nem a grosseira), donde depreendi que a minha amiga dirigia o seu bombardeio verbal ao mundo em geral, não a mim especificamente, embora me deslumbrasse também com a constatação da contínua evolução do nosso Altar do Mundo. E continuou, com igual vivacidade:
-Mas nós estamos bem servidos de Santos. Temos a protecção do Altar. O FMI vai saber. Eles, que vão cobrar alto e bom som, o trabalho deles vai ser altamente cobrado…
Aqui, não resisti:
- O trabalho deles ou a nossa falta dele… Podemos chamar-lhe incúria, também. anjice, burrice, ignorância governativa… ou política de fraude, de interesse particular, com muita ambição, muito apoio dos compadres, muita entrega ao esbulho, ao malabarismo enganador, às falsas ilusões de eficiência, à magalhanice de prateleira, porque está destinada à prateleira, tal como o país, no cômputo das nações europeias… Há um sem número de razões. Mas os troikos não devem estar habituados a isso, não deram por elas, ou não quiseram saber. E nós também não queremos saber, rendidos que estamos ao nosso próprio altar: aquele que o PM ergueu para nós, com o seu nariz de mentiroso compulsivo, que diz sim e não simultaneamente, que arruinou as gentes e reduziu o país a esta situação de cauda económica e não só. Mas nós o adoramos, o escutamos, o elegemos, altar do nosso mundo de “enfezadinhos”.
Mas a minha amiga estava na dela, de via-sacra, preferindo manter a ilusão da salvação:
- Ainda por cima este Papa, sendo polaco é quase português. A estátua foi feita por um escultor polaco, não deram a um português. Mas estamos muito bem. A irmã Lúcia também faz parte. Hoje é 13, sexta-feira. Ai hoje vai ser outra de devoção. Mais uns feriaditos vêm aí. O Santo Padre ainda não tem feriado. E vai ter. E a irmã Lúcia provavelmente também.
Apontei as entrevistas aos peregrinos como mais um aspecto negativo da nossa pobre aura, e a minha amiga lembrou-se da Aura Miguel, que foi entrevistada na RTP, e que ela conhecia:
- Estava com uma aura, ela que era uma timidazinha que eu conheci, caladinha, tipo freira… Ontem, quando vejo a Aura, ponho-me a olhar para ela, a contar os ditos do Papa, todos os outros calados, ela com grande aura. O Papa era uma simpatia de rapaz. Ela estava a dizer as frases dele. Ela sabe as frases todas. Não, não digo mais mal da Aura Miguel, porque estamos a 13 e as pedras da rua estão soltas…
A
minha amiga diz que confia e não confia assim tanto, nos Santos… Prova de que, afinal, todos temos alguma coisa do nosso Engenheiro, que também diz e desdiz, com igual facúndia.
Mas é porque andamos aleijadinhos de todo na alma, sem sabermos por que via optar, agora com as notícias da recessão e o PM a continuar a bradar contra todos e em prol dele, connosco a cair na sua goela gigantesca, contrariamente ao que fez a Capuchinho Vermelho que não caiu e fugiu da do Lobo Feroz, assim se safando... Mas também porque houve um caçador que resolveu a questão e nós não temos.
Não, ao contrário do que pensa a minha amiga, julgo que não há S. João Paulo II, mesmo com o apoio de todos os outros santos, que nos safe.

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