sexta-feira, 18 de março de 2011

O Coiso

- O Sócrates está contentíssimo porque fica livre de uma camada de coiso…
Fiquei baralhada, julgando que o rebentamento das centrais nucleares japonesas tivessem forjado já uma camada de irradiação radioactiva sobre os pobrezinhos de nós que não pudéssemos escapulir-nos, o que não seria o caso do nosso PM, que teria condições para isso, na opinião desabrida da minha amiga, adepta de doutrinas mais igualitárias do que as que costumamos seguir por cá. Mas pedi esclarecimentos, pois ainda não ouvira que ela – a camada - já cá chegara:
- Qual coiso?
- Ora, os encargos de governação de que ele se tem esforçado por se desprender, cometendo barbaridades e rebeldias de pessoa que se está nas tintas para as boas maneiras. Esta do Sócrates ter ido à Europa sem dar cavaco nem ao Cavaco…
Não quis mostrar menos certezas:
- Pois! E na tomada de posse do Presidente o ter dado cavaco preferencial aos jornalistas, desdenhando o protocolo de saudação ao PR, como convinha ao seu lugar cimeiro…
Mas a minha amiga tinha a sua fisgada, como um detective ou mesmo um psicólogo atrás das pistas:
- E a questão do novo PEC, que não foi esclarecida aquando do seu discurso de satisfação e contra-ataque, e logo a seguir, chamado por quem de direito, apresentou ao seu povo, com ou sem partido, um novo PEC drástico, para surpresa de toda a gente.
Marquei o meu saber, com severidade:
- Mas os dogmas unionistas europeus seguem a lei do poder mais forte, tal como se fez em todos os tempos, até nas fábulas, e por isso ele teve mesmo que lá ir, à Sr.ª Merckle, receber abraços fortalecedores e imposições de nova economia ao que se diz, enfraquecedora, mas mais dos fracos habituais.
- Ora! Saiu-lhe a sorte grande! Ele está a fazer tudo para se ver livre e passar a pasta das responsabilidades ao seguinte. O que é que deu na cabeça destes governantes de julgar que se iam aguentar!? Já para não falar na pouca-vergonha destes carros topos de gama e não tenho a certeza se já tiraram os assessores de imagem…
- Os jobs dos boys… , tentei a minha tímida colherada. Mas continuou, que estava embalada, no ataque ao escândalo – a parte dele:
- Ora este país porque é que se ia aguentar? Durante dez anos ninguém deu por ela, o próprio Cavaco, e esse tem diploma e tudo, e não deu por ela.
- Ora essa! Até deu o seu contributo! –
aventei, ainda timidamente.
- E aquele juiz que tem a coragem de pôr a Face Oculta às claras? Já lhe tiraram um complemento que ele recebia por trabalhar noutro cargo… Isto é ou não ditadura? Vai levá-los a Tribunal. Eles não percebem e estão escandalizados.
Embalei também:
- Não me parece ditadura. Trata-se de ordem, de conveniência, de bons costumes, de costumes discretos…
A minha amiga retrocedeu, embora com a altivez do costume, porque ela é das que protesta altivamente:
- Eu é que devo estar calada. Porque há tanta ratoeira nas ruas, tantos buracos e pedras à solta… E ninguém protesta. Só dizem que sim, que com efeito… sempre que eu falo… E Nosso Senhor castiga sempre. Eu já caí e muita gente que conheço… Mas porque é que os Portugueses têm esta carga da calçada à portuguesa? Que ainda por cima fica mais cara e morosa do que a de cimento…
- Ora, o remédio está para cá de Roma. O que é preciso é olhar-se mais para o chão, ao contrário do peixinho quatro-olhos do Sermão do Padre Vieira, o qual tanto pode olhar para cima como para baixo, lembrando-se de que há o Céu por cima e o Inferno por baixo. Mais vale prevenirmo-nos e olharmos hoje só para baixo. É muito grave o nosso coiso. Os budistas e outros intelectuais diriam karma.

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