segunda-feira, 7 de março de 2011

O amigo de Peniche

Desta vez fui eu que transmiti à minha amiga a notícia, que ouvi não sei bem em que canal, distraída que estava a descascar a cebola do meu vale de lágrimas, e a minha amiga também se sentiu inicialmente eufórica quando eu lha transmiti, pois a notícia é daquelas que no nosso país de vez em quando se propala, para continuarmos a manter a ilusão da solução, e nós assim vamos continuando, sempre que surge a notícia do ouro preto em Portugal, quer ele esteja em Peniche, quer esteja no Alentejo, quer mesmo só no Beato, embora a minha amiga considerasse, logo a seguir, ter mais fé no santo António, o que é disparate, visto os efeitos benéficos que o petróleo provoca no mundo inteiro, no meu ponto de vista deslumbrado. Talvez, nesse caso, mais valesse, segundo objectei, crer no Dom Sebastião, mesmo que ele nunca mais chegasse, pois fazia mais parte do nosso apego secular, que até se traduziu em trovas, em dramas e outros poemas do nosso engenho, de longa data a braços entre a crise e a ilusão, nosso fado triste.
Quanto ao petróleo, parece que estamos ainda na fase da prospecção – tal como o regresso do D. Sebastião - por conta duma empresa brasileira e mais outras portuguesas a arriscar, embora já o Raul Solnado, há muitos anos, através de uma sua personagem, tenha explorado essa questão do petróleo que apareceu no seu quintal do Beato, quando arrancavam uma alface para a salada da família.
A minha amiga ambiciosa logo disse “Era uma safa se se descobrisse petróleo em Portugal” e eu bem que concordei, que de safa é que a gente mais precisa - pois quanto a safras estamos arrumados - e enquanto isso, vamos deixando que os habituais solucionadores da crise continuem paulatinamente e exclusivamente na safra do seu próprio bem, salpicando a sua promessa do bem comum com estas atoardas esmoleres, sobre um provável petróleo nacional jorrando aqui ou além, mesmo no Beato, outras vezes em Peniche e outras no Alentejo, para irmos vivendo na ilusão da solução sempre adiada, de uma crise comum - com excepções - permanentemente presente.
Como sempre pessimista, embora ambiciosa, a minha amiga considerou que nem uma gota lhe caberia em sorte, fazendo com isso supor que a mim caberia, o que me desvaneceu à ideia da gota, pois também sou ambiciosa, mas eu logo expliquei que, mesmo que as gotas fossem canalizadas para os sortudos habituais, outros mais receberiam a benesse – da safra, pelo menos, eliminando assim parte do espectro do desemprego, além de que deixaríamos de importar o petróleo habitual e até talvez conseguíssemos exportar do nosso, para inveja dos povos como aquele a que pertence a senhora Merckel que estendeu o braço compincha ao nosso PM, mas, se este tivesse de facto petróleo, fosse lá onde fosse, poderia ser ele a estender o seu, honrosamente, levando-lhe umas amostras do nosso crude de Peniche, para comercializar.
A minha amiga continuou renitente, está visto que a mania do Santo António quadra mais às suas expectativas:
- Um país com petróleo é um perigo enorme, porque nos países com petróleo o Zé Povo é tão pobrezinho, tão pobrezinho, tão pobrezinho… Até o Dubai tem os pobrezinhos do petróleo.
E voltámos tristemente à nossa condição de agarrados mais aos nossos santos da safa – não da safra – o próprio Messias fosse, que nos safasse.

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