quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

“Já temos um tornado, coisa que a gente não tinha”

- Afinal somos p’rà frentex, somos iguais aos outros - disse a minha amiga, a optimizar perspectivas radiosas para nós, para contrapor ao tom depreciativo das suas expansões habituais. – Já temos um tornado, coisa que a gente não tinha.
Censurei a troça, reivindiquei mesmo, não digo um tornado, mas os nossos ciclones, lembrando um, dos meus tempos de criança, na aldeia onde vivia, que destelhou o telhado da nossa casa e obrigou a minha mãe a pôr vasilhas no chão para não termos que boiar no chão da cozinha. Mas concordei que tornados de fazer andar tudo num virote diabólico, só mesmo lá pelas Américas, por enquanto. Nós estamos ainda no paleolítico, não nos devemos precipitar em paralelos modernistas.
Não, nunca chegaremos aos calcanhares de ninguém, nem mesmo nos tornados.
E contei de um programa francês que ouvi há dias, antes do “Questions pour un Champion”, programa de entrevistas que, nesse dia, coube a um jovem português responder. Talvez fosse seminarista, talvez fosse frade, ouvi-o tarde, não captei a apresentação. Mas fiquei engasgada com a linguagem doce, de jovem que deseja manter a ingenuidade do menino, que não larga a casa dos pais, que fala em bondade e nada mais, que não se afirma como ser responsável, mas se serve de uma linguagem banal, sem objectivos reais, um discurso vazio, repetitivo, de um lirismo torpe, sem uma ideia, sem um conhecimento feito de leitura, de reflexão, de evolução no raciocínio, discurso babado, discurso abjecto. A idiotia sem tréguas, como resultado da educação que tem sido a nossa.
- O quê? Já? – foi o meu comentário agoniado na constatação de uma realidade pegada à nossa pobre crosta nacional.
Mas a minha amiga, confiante nos tornados que já cá temos, insiste em que os nossos Magalhães vão ajudar à reflexão da nossa juventude.
Não posso, pois, precipitar-me nos meus complexos humilhados, no paralelo com outros jovens de outros sóis diferentes. Felizmente ainda temos jovens autênticos, responsáveis. Que não chegam, é bem verdade, para limpar da crosta.
- O autor do programa francês foi muito pouco simpático – concluí com rancor - ao escolher tal exemplar para a imagem da nossa juventude. É por isso que a nossa auto-estima se vai esboroando, mesmo sem tornado que preste.
E ambas largámos os tornados, para desancar, patrioticamente, a vileza xenófoba do autor do programa francês, que sabia bem quanto nos expunha ao ridículo, com aquela figura flácida e alva, largando inépcias, buraco negro do nada.

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