segunda-feira, 27 de setembro de 2010

“Chamem-se as donas de casa”

- Ai, as notícias são tristíssimas, alarmantes, degradantes – responde a minha amiga à minha questão sobre o andamento das coisas por cá. - Quando eles põem lá os milhões que se devem, os milhões que se gastaram, tudo cabeças leves, é o que se deduz. E ainda se permitem mudar as frotas dos carrões.
Com a integridade em que fui educada desde a idade tenra, repus a verdade, segundo a notícia que ouvira de que a frota topo de gama este ano não se mudava, mas a minha amiga não acredita muito nas minhas informações, geralmente escutadas com a ligeireza da dispersão, é certo, mas não desta vez, garanti, formalizada.
- Se proibiram, foi o mês passado. Desde o 25 de Abril era só mudar as frotas.
E retomou, com arranque, a questão económica:
- Entreguem às donas de casa, qualquer dona de casa via isso – os gastos superiores aos ganhos – menos os palermas. Estes nunca souberam fazer contas. Coisa tão estúpida, tanta asneirada, um país que não produz… O destino deste país mudou no dia em que morreram Sá Carneiro e Amaro da Costa. Com estes, seria a mudança. Não estou a dizer que seria um país rico, mas normal. Era gente com vontade de fazer obra. Foi por isso que morreram. A pouca sorte dos portugueses foi aquele crime. Eram dois homens interessados. Eles e os que os acompanhavam. Como foi possível? Um país deste tamanho… era caso para levar isto a sério… descobrir quem os matou.
- Nisso concordo. Mas o destino dos portugueses mudou muito mais cedo. E quando os diques rompem, dificilmente se reconstrói, vai tudo raso. Eles fizeram parte da enxurrada que o dique provocou, mau grado as suas boas intenções. E por aqui vamos nós também, na enxurrada que irá atingir as gerações vindouras, cada vez mais desabituadas de fazer contas, indispensáveis para o travão. O actual ensino dá-lhes brinquedos para não se preocuparem muito com previsões e cálculos, retira-lhes a reflexão do ensino sério e responsável.
A minha amiga mudou de assunto, com a costumada volubilidade:
- A gente ainda não falámos – é assim que se diz, não é? – nos mineiros do Chile, que aquilo é uma coisa horrorosa. Como é possível que haja minas assim a arriscar a vida dos homens daquela maneira? E não há solução rápida. E os donos são muita ricos, muita ricos – e aquela gente festeja, lá fechados… Falam em três meses para sair, se conseguirem. Falta o ar só de pensar. Como é que se permite que estes homens trabalhem nesta profundidade?! Uma mina! Há um espação de tempo para lá se chegar ao sítio. Há direito que o ser humano desça tão fundo?! Aquilo é crueldade até dizer chega. Tudo o que vive ali na terra é mineiro. Têm um ordenado que dá para formarem família. E os donos muita ricos. É exploração pura…
- Os submarinos também causam falta de ar. Lembra-se do desastre do submarino russo no mar Árctico, há uns anos? A minha mãe nunca gostou do Putin, em parte, à conta disso, porque o Putin não interrompeu as suas férias para se associar ao pavor que foi, que nós vivemos cá em casa com verdadeiro horror .
- Cá e lá e mais acolá más fadas há, é a conclusão…
- Pois, mas o sofrimento de lá e de acolá é mais violento. Nós por cá até somos favorecidos. Pela nossa falta de educação e vergonha, de vivermos há longos anos à custa alheia, sem preocupação. Parece que chegou a vez de pagarmos em força. Mas sempre temos o fado a ajudar-nos a superar a dor...

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