sábado, 31 de julho de 2010

Queria tanto viver!

António Feio! A minha amiga falou:
- Ele seria o primeiro a salvar-se desta doença. Não há memória, porque aqueles actores que recorrem a outros países também não escapam. Este tentou tratamentos em Londres e em Barcelona. Mas é igualzinho aos que não saem daqui. O pâncreas! É um órgão muito pequenino e muito escondido. O marido da minha vizinha teve um desmaio. Foi ao médico, nada de grave, ou antes, nada detectado, voltaram para casa. Afinal, fora o primeiro sintoma. Morreu, três meses depois. Ninguém escapa. António Feio conseguiu sobreviver mais de um ano ao prognóstico.
- Um extraordinário actor, cujo primeiro prémio lhe foi oferecido por um discípulo que o recebeu e lho deu espontaneamente, como merecedor maior. Devem ter-se sentido envergonhados os distribuidores de prémios, pelo lapso. E talvez não! Já estamos habituados.
- Olha o Victor Espadinha! Porque andará tão arredado dos palcos televisivos? Tantos actores na prateleira! Um país bem ingrato, este nosso.
- Ligamos sobretudo à beleza física, prezamos sobretudo os jovens actores e actrizes. E no entanto, a idade traz uma experiência ao nível de todas as profissões, é certo, não só dos actores, que a beleza da juventude só, não consegue suprir. Mas nós olhamos para os jogadores de futebol, vemo-los com o estatuto da excelência, na sua juventude, e como valorizamos esse desporto acima de tudo, generalizamos a condição de excelência a essa fase da vida.
- É! Pensamos com os pés. Pobre António Feio, que tão extraordinários momentos de humor nos apresentou, juntamente com o seu outro extraordinário actor e seu amigo, José Pedro Gomes!
- Eu lembro-me também da Irene Isidro, do encanto que senti em Lourenço Marques, quando lá foi com tantos outros actores – Costinha, Henrique Santana... – representar peças várias, bem cómicas, entre as quais “O Gato” – provocando gargalhadas de prazer pela excelência da actuação. Não sei se alguma vez recebeu algum prémio, aos actores talvez bastem os aplausos do público. Não era uma beleza, Irene Isidro. E, no entanto, quanto domínio na arte de bem representar! Nunca a pude esquecer.
- A Maria Dulce é outra! Bem melhor agora do que no tempo da Maria do “Frei Luís de Sousa”! Será que alguém a reconhece como tal?
- E voltamos sempre ao nosso Camões, que tanto foi também menosprezado: “Ditosa Pátria que tais filhos teve!” e, simultaneamente,
“O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza.”
E assim, sempre. Uma lágrima sentida, por António Feio.

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