sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Parabéns a você

O relatório da OCDE sobre a nossa Educação foi muito favorável à nossa educação. O Sr. Primeiro Ministro disse-o, deu os parabéns à Srª Ministra da nossa Educação, que se manifestou em riso discreto, contido, já por via do seu conhecimento experiente destas subidas da fama oportunisticamente aproveitadas, já por via do seu conhecimento literário evocativo do Velho do Restelo sobre a relatividade daquela:
Ó glória de mandar, ó vã cobiça / Desta vaidade a quem chamamos fama! / Ó fraudulento gosto que se atiça / Co’a aura popular que honra se chama!”.
Ela sabe que aquilo da OCDE não é tão exacto assim, segundo as más línguas –mais as dos opositores - pois que o relatório foi elaborado segundo estudos veiculados a dedo em zonas capciosamente escolhidas para a anotação da excelência dos resultados e das conclusões.
A gente sabe como o nosso país é atrasado, desde sempre que é atrasado, com relatos de nacionais e estrangeiros que o denunciam de longa data. Que o nosso ensino sempre se polarizou em torno das elites, que ao povo competiu trabalhar para elas, que os gastos com a sua educação, tal como com o arranjo dos seus dentes, nunca fizeram parte da maioria das intenções governativas.
Como quer o Sr. Primeiro Ministro que a gente acredite que o exemplo de recuperação nacional é modelo a seguir pelo estrangeiro, com a sua educação e cultura estratificadas, como nós nunca teremos, a menos que vamos estudar ou tratar da boca lá fora?
Por isso, tanta exuberância do nosso Primeiro Ministro no seu auto-elogio, configurando sentida homenagem aos inefáveis magalhães, e sentida gratidão pela nossa Ministra da Educação, que produziu o milagre referido no tal relatório, não passam de puras fanfarronadas.
Foi Corneille que escreveu “Le Menteur”, mas com outros mais heróis da ficção poderemos equiparar o nosso Ministro. Até mesmo com o Dom Quixote, que tomava moinhos de vento por gigantes. Diversa, contudo, a fantasia - ou o sonho - que moveu cada um deles.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Uma justiça de trazer por... autarquia

O programa até foi bonito, desenxovalhado, bem apresentado, por uma apresentadora bonita, garrida e meiga – a Catarina habituara-nos à garridice, à meiguice e à beleza, que se manteve na sua continuadora Sílvia – um júri alegre, humano e competente, com um professor italiano excelente, a quem o país tanto deve em termos de coreografia, plasticidade e poder criativo, de quadros progressivamente enriquecidos, de dificuldade acrescida. Foi bonito ver os pais e as mães acompanhando os filhos e as filhas, aprendendo com eles para os fazer brilhar.
Muitos pares foram ficando pelo caminho que devem ser estimulados – relativamente aos filhos, é claro – a trabalhar na área da dança, em função da sua realização pessoal e do enriquecimento do seu país, que um grande senhor italiano ajudou a projectar nesta área das danças de salão. A nossa gratidão por ele, os nossos parabéns a todos, concorrentes, júri, apresentadora, professor italiano, figurinistas, num espectáculo onde realçou a beleza, a harmonia, e a simpatia.
Mas o final foi triste. O júri simpático, que tinha valorizado o par Vanda e Francelino com alguns vintes que o posicionava em lugar cimeiro, no último espectáculo deixou-se, à maneira bem portuguesa, que arrastou o próprio professor italiano Marco, a realçar os pais e sobretudo a mãe do concorrente vencedor, numa coreografia que imitou grotescamente a da Vanda, pondo o próprio filho em segundo plano para fazer exibir a mãe. Gesto bonito de todos, mas não se tratava de uma exposição de afectos.
Porque o par Vanda-Francelino superou em beleza, correcção e harmonia todos os mais. Fora ela de Matozinhos, teria ganho. Mas era de Pombal, menos bairrista, e perdeu. Aconteceu o mesmo no Julgamento de Páris, causa primeira da guerra de Tróia. Fora Páris menos mulherengo e não se deixaria subornar por Vénus.
O meu pomo de oiro vai para a Vanda. Com profunda admiração. Sem suborno. Mas com tristeza, por ser tão parola a nossa justiça.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Inteligência


Logo após o 25 de abril – antes dele mal se sabia disso – comecei a ouvir que a inteligência reside na esquerda. Fiquei muito admirada, porque nunca se me tinha posto tal questão, e muito menos em termos tão radicais, achando imprescindível o funcionamento harmonioso de ambas partes, sendo a sua troca, anotada pelo saudoso Max, motivo da nossa hilaridade paternalista, atidos que estávamos ao conceito da falta de princípios escolares como origem dessa deficiência específica dos taratas.
O 25 de Abril, contudo, abriu-nos a consciência para a confusão, que ultrapassou o “trinta e um” das paradas militares, porque começámos a notar magotes de pessoas adeptas da tal esquerda, que as irmanava com a inteligência, proporcionando-lhes benefícios sociais e materiais e a consideração geral deles dependente. Para se ter acesso em concursos, para se progredir nas carreiras, convinha mostrarmo-nos inteligentemente seguidores de princípios defensores dos desfavorecidos, que dantes pertenciam aos cavaleiros andantes e que passaram a ser pertença da tal esquerda inteligente.
Por isso, quando ouvimos o discurso do Dr. Paulo Portas, impregnado de velhos critérios de uma natural nobreza, exigente de ordem nas contas e nos comportamentos, achámo-lo não só corajoso, por se definir como de direita, arrostando os adamastores da inteligência depreciativa e eficaz, mas de grande potencial de entusiasmo e visão estruturadora, que não receia retomar do passado aquilo que de bom nele existiu.
Por isso, desejámos para ele o êxito que ele gostaria de ter no seu partido e no seu país. Bastava só que se cumprisse a troca do "trinta e um", à ordem do seu comandante: “Se p’r’à esquerda ouço dizer, viro sempre p’r’à direita”.
Mas nem assim mudaríamos, creio bem, que o defeito mora em todos nós –direita ou esquerda, indiferentemente - profundamente adeptos do “salve-se quem puder, começando por mim”.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Publicidade, o melhor dos remédios

As informações surgiram radiantes nos jornais escritos e falados. Tratava-se de um cão d’água lusitano, opção da família Obama, para companheiro na Casa Branca. Ficámos orgulhosos. Pouco antes, tinha sido um computador lusitano em expansão pelo mundo, não à maneira do Magalhães antigo, que esse entregou a alma a meio da viagem, enquanto que o actual até já conquistou seguidores lá pela China.
Não temos, todavia, a veleidade de supor natural de cá o cão d’água futuro de Obama. Achamos, modestamente, que o cão d’água é de lá, descendente de emigrantes lusitanos, por isso, com o desenvolvimento cultural e linguístico desse país onde nasceu, mas não deixamos de apreciar regozijadamente o facto.
Sempre nos orgulhamos com os êxitos dos nossos – sejam eles naturais de cá ou em trânsito pelo mundo. Aliás, no estrangeiro é que os nossos valores melhor se definem, por haver lá meios de avaliação mais sofisticados.
E se o nosso cão d’água atingir uma glória idêntica à daquele outro cão dos Baskervilles, só nos resta agradecer-lhe, pois uma boa guarda do Palácio Presidencial não terá menos impacto do que a terrível mistificação forjada por Sir Conan Doyle, que lhe trouxe tanta da glória e até resultou no cinema.
Talvez o nosso cão d’ água lusitano tenha a ocasião de se revelar, como o outro, “horrendo, fero, ingente e temeroso” para defesa de heranças ou de valores que outros pseudo-herdeiros poderão disputar aos novos moradores da Casa Branca, pese embora a sua função lúdica que lhe está destinada. É sempre bom contarmos com os imprevistos, muito mais num país de tanta dimensão como o do seu quase presente Presidente.
Neste mundo constantemente em lutas, todas as ajudas são de aproveitar, até mesmo as dos cães para as brincadeiras das crianças. E a glória do cão d’água lusitano será a nossa também, não temos qualquer dúvida. Tal como a taça do Cristiano.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

A propósito de uma entrevista (Resposta ao Sr. José Pires – em artigo de “Portugal Clube” e a um tal S. Potêncio do mesmo “Clube”)


Duvido que esse carisma de “espião” e malhas da sua engrenagem se apliquem em tal dimensão aos nossos governantezinhos ambiciosos e seus acólitos. De facto, a analogia que melhor me acode é a do herói infantil “Rato Mickey”, que por lapso escrevi “Pato Donald”– por confusão de vozes, muito semelhantes ao grasnar comum a homens e bichos – a cujas mãos brincalhonas coube a missão de destruir – de continuar destruindo – uma nação que outros tinham engrandecido (“sui generis” é certo, que o requinte dos Palmas Cavalões jamais faltará, como estigma, na nossa educação esmerada) uma nação que outros tinham engrandecido, já tão “outrora”!
Não, não passamos de uns meros ratinhos, nesse jogo da destruição, que rima com “corrupção”, é claro, mais do que com “espião”, convém sermos modestos.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

A entrevista

Esta entrevista ao Engenheiro José Sócrates do dia 5 do corrente novo ano, pelos jornalistas televisivos Ricardo Costa e José Ferreira, ambos magrinhos, e por isso incapazes de penetrar a armadura bem estruturada da estatura ministerial, deixou-nos muito perplexos. Mas também os comentadores que assinalaram a entrevista logo a seguir, nos vários canais, bem se viu que também não são consensuais. Tudo depende da perspectiva, ou seja, do partido que os rege.
Os do PS são unânimes em crer na força vocal do homem do governo, correspondente às suas boas intenções de suster providencialmente o caudal de desgraças que se avizinha – desemprego, despedimentos, esbanjamentos, caos familiares em consequência... Houve mesmo quem alvitrasse sobre a luz ao fundo do túnel que o nosso Primeiro representa, com a sua força, com o abrir da bolsa antes avara, agora generosa, de contas a trouxe-mouxe, em significativa homenagem a um curso, ao que parece feito também um pouco a trouxe-mouxe, embora bem avaliado, daí que ele ponha tanto finca-pé na avaliação do país.
Todos os outros partidos, por desconhecerem o tamanho do túnel, ou por falta de visibilidade da luz ao fundo dele, recorrem antes à imagem do aprendiz de feiticeiro do poema de Goethe, musicado por Paul Dukas e utilizado por Walt Disney no seu maravilhoso filme animado “Fantasia”.
Nele, o Rato Mickey faz de aprendiz, que, para bater umas sornas adequadas, utiliza os poderes do tio feiticeiro para a vassoura e os dois baldes carregarem a água para as tinas da casa, trabalho da sua competência. O resultado é a inundação que o tio desfaz, em comunhão com a música de Dukas, além da vassourada que repõe o aprendiz no lugar que lhe compete.
Mas a nós não haverá tio para repor, D. Sebastião definitivamente arrumado e o Messias malbaratado em todas as partes da aldeia. Resta-nos o Rato Mickey com os seus malabarismos, com a sua voz sonora. Malabarismos são sempre o nosso forte. E dos roncadores já Vieira escreveu.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Pedaladas Bíblicas

Era Job quem se queixava – “Tivera ovelhas, bois, mulher, lavoura”, à Cesário Verde, ou, em jeito mais corriqueiro, fora rico, afortunado, ampla a família, lautos os banquetes. Mas empobreceu. Apesar dos queixumes, não deixou nunca de louvar ao Senhor. E o Senhor – Jeová de seu nome, na altura, - compensou-o, multiplicando-lhe os bens.
Há dias, pelos fins do ano, o nosso P.R. também se queixou. E até foi severo. Tratava-se de umas cláusulas num estatuto insular, desprestigiantes, segundo o seu conceito firme, para os futuros presidentes continentais, que não para si, note-se. A voz era dolorosa, quase tonitruante, quase ameaçadora. Receámos as consequências. Fizeram-se apostas: “Vai demitir-se!”. “Qual quê! Demite, sim, o Parlamento” – que o Parlamento bem o merecia, até mesmo o CDS-PP, na questão da solidariedade. “Vai, mas é, demitir o Presidente dos Açores, para não ser ganancioso, para mais com o aval do da Madeira, que lhe vai gostosamente no encalço, em ambição “garganera”, libertária de tutelas!”. “Aposto que não vai tomar medidas!”. “Aposto que sim, que o discurso deixa prever sanções fortes!”
Enganaram-se os apostadores. Menos o céptico na questão das medidas.
O P.R. já tinha outorgado o estatuto da disputa. Antes do discurso televisivo das tristes queixas, com que mimoseou os destinatários – patriotas ou assim assim. Como Job, mesmo na humilhação e na desgraça, continuaria a louvar a Jeová. E Jeová, sorridente, por isso o protegerá.
Há também o exemplo bíblico de Pilatos, que lavou as mãos impotentes. O nosso P. R. bem avisou do crime, mas a fé em Jeová venceu. E então ele lavou as mãos dos pecados alheios, dando aval ao estatuto insular, mesmo com desprestígio continental. Continuará rico e imaculado, por decisão definitiva. Apesar da dor.
Grande é o poder do Senhor, ínvios são os caminhos para o poder. Na Terra, mais rigorosamente. Outrora como agora.